E mais uma vez uma vez sou gratamente surpreendido por ir assistir um filme sem saber do que ele se trata. Como disse algumas vezes aqui, prefiro chegar numa sessão completamente sem embasamento dele e as vezes sair feliz, do que chegar já com algum pré-conceito do que pode realmente atingir um longa. E com "Marina", apenas tinha lido uma pequena sinopse e visto o pôster, onde já havia apenas induzido se tratar de algo polêmico, mas o que me esperava muito pelo contrário, era um filme sutil, gostoso de ver, onde a história embora não seja muito conhecida, pelo menos por mim, já é de praxe, um pai que se revolta com a escolha do filho virar artista, querendo um emprego decente para ele, e esse contra sua vontade e contra todos que possam atrapalhar, vai lá e consegue fazer do seu sonho, seu ganha pão. Claro que muitos ao lerem esse pequeno parágrafo já irá dizer que viu milhares de outros filmes iguais, mas posso dizer que cada um consegue ter sua beleza e seu primor, e com esse filme ítalo-belga não é diferente por caracterizar um jovem num país onde não domina a língua, todos são contra estrangeiros, e além disso sofre todo tipo de discriminação inclusive pelo próprio pai numa época difícil na Europa.
O filme nos situa na Itália em 1948, onde o jovem Rocco cresce na Calábria, até que um dia seu pai Salvatore decide ir para a Bélgica, onde luta para ganhar dinheiro trabalhando numa mina de carvão. Logo, ele manda buscar a família. Do dia para a noite, Rocco vira um imigrante e tem que lidar com a nova situação. Rocco quer ser como os outros jovens, quer tornar-se alguém e ter um propósito na vida. Contra a vontade de seu pai, ele encontra um escape na música e no amor. Baseado nas memórias de infância do cantor ítalo-belga Rocco Granata.
É interessante ver a forma ritmada gostosa que o diretor Stun Coninx conseguiu imprimir num filme que poderia ser mil vezes mais dramatizado, e com essa levada parece que tudo é mais fácil de acontecer para o garoto, mas no decorrer do filme, vemos que não é bem assim que tudo acontece, pois tudo é bem difícil de dar certo e quando parece que vai dar rumo, alguma coisa ruim acontece e atrapalha tudo novamente. Além disso, o diretor que já conseguiu uma indicação ao Oscar de Filme Estrangeiro em 92, faz um paralelo que é bem bacana de ver em filmes, de acreditar num sonho e não desistir dele jamais, isso é raro ver em filmes dramáticos, e muito menos em Mostras de Cinema, que preferem manter um apelo mais forte nas temáticas, e com isso acabam entrando em vertentes nem sempre gostosas para que o público em geral assista. Com esse filme, acredito certamente que entrando em circuito comercial, teriam muitas pessoas que gostariam de vê-lo, principalmente quem viveu nos anos 60-70 que deve ter sido embalado pelas músicas que o cantor acabou ficando famoso. Outro ponto certeiro, foi o de não abusar tanto de closes, optando mais por planos médios e tomadas abertas, onde o ator com todo seu jeito italiano de ser que conhecemos bem, pode se expressar bem com as mãos e com o corpo todo, dando uma graça a mais para o filme.
Os jovens atores conseguiram manter bem o filme, pois como a interpretação forte recai quase sempre pro protagonista, seja na sua fase infantil ou depois quando jovem, sempre é sua ligação com o pai que faz os vértices da trama fluírem, e nesse quesito não somos decepcionados em nenhum momento. Na fase infantil, somos surpreendidos novamente com um novato frente às câmeras, Cristiaan Campagna começa bem no filme e mostra dinamismo para conseguir adequar tudo que o diretor quer que mostre, e faz bem, com caras de sofrimento, alegria e até mesmo nervosismo que o qual não demonstra em momento algum parecer nervoso de estar fazendo tudo que faz. Na fase adolescente, Matteo Simoni mostra sentimento forte e raça em desafiar tudo e todos, tenho a leve impressão de já ter visto ele em algum outro filme, mas não consegui achar nada pela sua filmografia, mas isso não vem ao caso, aqui ele faz bem na maioria das cenas, tirando certos momentos que força demais seu semblante parecendo estar um pouco irritado com o que está fazendo, pode ter sido algum problema interno que deixou transparecer frente às câmeras, mas que felizmente não atrapalha as demais cenas que faz bem demais. Luigi Lo Cascio coloca toda a postura para trás e não deixa brechas para nada de um pai bonzinho que aparenta ser no começo, claro que todo o sofrimento de trabalhar numa mina leva a isso, e o ator soube passar bem essa inversão de valores ao sair da Itália e ir para a Bélgica, e o experiente ator soube agradar mesmo sendo severo com o protagonista em alguns momentos. Donatella Finocchiaro faz o papel que toda mãe cai em filmes desse estilo, ocultando segredos para ajudar o filho e sendo doce quando precisa, e misteriosa para o pai quando precisa também, poderia ter feito uma cara um pouco menos sofrida, que chegamos a ter piedade dela em alguns momentos e tenho certeza de que não era isso que o diretor queria passar. Evelien Bosmans faz bem seu papel, mas acabou ficando um pouco opaca demais para ser alguém pela qual o protagonista deseje compor algo e deseje muito mais por ela, tudo que faz não dá a química necessária para chamar atenção pra si.
O visual do filme agrada no modo intimista que souberam demonstrar, mas embora mostrem que a família sempre foi discriminada por ser estrangeira e com isso mostra que são pobres num país teoricamente rico, ficou com uma sensação estranha de que o diretor tentou impor uma crítica social no meio do filme, mas acabou não ficando evidente. Ficou querendo ser chocante, mas colocando apenas panos mornos na tela. Em quesito de elementos cênicos souberam trabalhar bem para mostrar tanto a pobreza da família quanto das locações por onde passam, opondo com o restante da cidade, e isso ficou bem interessante de ver. A fotografia é um pouco suja, já que quiseram passar uma tendência de época, mas poderiam ter trabalhado mais com cores claras em algumas cenas que ficaram calmas demais e poderiam atingir outras vertentes se fossem mais dramatizadas.
Outro ponto que poderia ser melhorado, mesmo que colocando apenas as duas músicas mais famosas do cantor na adolescência, poderiam ter colocado outras canções mesmo que de pano de fundo, pois posso falar que já sei cantar de cor e salteado as duas canções repetidas a todo momento, e embora elas deem o ritmo que gostei no filme, ficou um pouco massante ouvir só elas.
Enfim, é um filme doce e agradável de assistir, nada que fosse surpreendente demais tecnicamente, mas que me surpreendeu por ser algo que nunca esperaria ver numa Mostra, e com isso vejo que finalmente estão pensando em colocar um público mais abrangente para assistir os filmes que desejam passar nesses locais também. É isso pessoal, recomendo sim o longa, principalmente para quem tem um sonho e a família não apoia, para que não desista jamais. Fico por aqui hoje, mas amanhã volto com o penúltimo longa da Itinerância da 37ª Mostra Internacional de São Paulo. Então abraços e até amanhã pessoal.
0 comentários:
Postar um comentário
Obrigado por comentar em meu site... desde já agradeço por ler minhas críticas...