Las Acacias

5/09/2014 01:03:00 AM |

O cinema argentino é um dos poucos que conseguem nos colocar em situações inusitadas, montar um filme totalmente simples e ainda assim nos encantar, não necessitando de um roteiro trabalhado em diálogos, atores fazendo trejeitos para as câmeras e muito menos orçamentos estourados para fazer com que uma história agrade a todos numa sessão única e reconfortante. Com essas palavras praticamente resumo o filme "Las Acacias", onde o diretor nos coloca quase imersos à cabine do caminhão junto dos protagonistas viajando por dois países quase sem diálogos e impressiona pela sensibilidade que sua câmera consegue captar nessa viagem.

O filme nos mostra que Rubén é um caminhoneiro que transporta madeira entre Asunción, no Paraguai, e Buenos Aires, na Argentina. Ele faz esse mesmo trajeto há anos, sempre solitário e silencioso. Um dia, no entanto, ele aceita dar carona a uma mulher desconhecida até Buenos Aires. Mas Jacinta, sua companheira de viagem, aparece uma hora atrasada, e com um bebê no colo. A primeira impressão de Rubén não é nada positiva: ele imagina passar longas horas ao lado de um bebê chorando e de uma pessoa por quem ele não tem o menor interesse. Aos poucos, no entanto, Rubén e Jacinta começam a trocar as primeiras palavras, e a se conhecer melhor.

A história em si é bem simples, pois ao que tudo indica para dar errado, e ao mesmo tempo também muito certo, a trama foi elaborada para ir num ritmo devagar, mas que não chega a cansar, pois os atores vão se conhecendo bem lentamente e assim como numa viagem normal, com pessoas tímidas ou que tiveram algum problema, as palavras só vão saindo ao acaso e necessitam claro de alguns empurrões para que algo fique interessante, aí é que entra Nayra, ou Anahi com toda graciosidade de um bebê que exigiu demais da produção pelas curiosidades passadas, mas que deu todo um resultado impressionante no longa de estreia de Pablo Giorgelli à frente da direção. Outro fator que incomoda, mas tem todo um contexto interessante é o barulho do motor do caminhão que diferentemente do que muitos fariam para minimizar problemas, aqui tudo é real, e as câmeras bem escolhidas em pontos estratégicos captaram detalhes que nenhum outro modelo poderia fazer a impressão passada.

No quesito atuação, muitos poderiam até falar que faltou química ou até mesmo dinamicidade entre os protagonistas, mas é justamente esse o grande acerto do filme, portanto Germán de Silva foi satisfatório ao incorporar um caminhoneiro tradicionalista que só vive em seu mundo fechado dentro do caminhão, viajando mudo e esquecendo tudo que acontece fora dali, sua expressão fechada recai perfeitamente nos momentos exatos e quando se abre para a mini protagonista é de um deslumbre só. Hebe Duarte era assistente da diretora de elenco, e estreando do outro lado da câmera conseguiu emocionar o público sendo uma mulher comum imigrante a fuga de um lugar melhor para viver com sua filha e as características da atriz nos impressiona por não ser alguém que chame a atenção fisicamente, mas seu jeito e pausa na forma de falar agrada demais a ideia do filme, tanto que acabou abocanhando o prêmio de atriz revelação da Academia Argentina de Cinema. Agora sem dúvida alguma o destaque do filme é Nayra Calle Mamani que fez a produção toda trabalhar horrores e um filme que tecnicamente seria gravado em 3-5 dias no máximo acabou durando 5 semanas por depender das vontades da criança para fazer exatamente as expressões que precisavam para a trama, e isso ficou muito bacana de ver no filme, divertindo a todos sem exceção, até quem não curtir crianças vai se divertir com as expressões da garotinha.

O visual do "road-movie" é bacana e nos lembra um pouco as viagens pelo interior do Brasil, onde só se vê mato, apesar que aqui só se vê cana, ao contrário de pastagens como lá. E todas as paradas mostram lugares pobres, mas que entram para história com detalhes únicos no momento certo que cada item vale ser ressaltado e de forma bem inteligente com elementos cênicos precisos para que não forçasse o espectador a nada, apenas mostra, está ali e entenda como quiser cada ato. Por ser um filme inteiramente em movimento, a fotografia não pode se preocupar muito, então temos reflexos e iluminações precárias em alguns momentos, mas em momento algum isso atrapalha nosso apreço pelo que vemos na tela.

Enfim, é um filme que ou você vai se conectar com ele, por ser tímido, por gostar de criança, ou apenas por ser algo simples e bem feito, ou vai odiar, como vi também algumas pessoas na sala. Então se você se encaixa em algum dos três perfis que citei, assista, senão talvez o filme pode acabar se tornando um martírio visual como costumo definir filmes que parecem não ter dinâmica com poucos diálogos e cenários quase únicos. Como me encaixo em 2 dos 3 quesitos, adorei o que vi e recomendo bastante. Bem é isso pessoal, infelizmente o Festival SESC Melhores Filmes terminou aqui na cidade, em algumas outras continua tendo, mas agora é conferir as estreias normalmente todas as semanas e aguardar o próximo Festival que aparecer por aqui. Abraços e até breve com mais filmes que estrearam por aqui.


0 comentários:

Postar um comentário

Obrigado por comentar em meu site... desde já agradeço por ler minhas críticas...