A Teoria de Tudo

2/28/2015 02:15:00 AM |

É tão comum fazerem biografias de pessoas que já morreram, que quando vemos uma história real nos cinemas, a primeira pergunta que ouvimos na sessão de cinema é: "ele morreu quando?", logo em seguida vem "não tem como uma pessoa viver assim!", e daí você sai da sessão de "A Teoria de Tudo" pensando como você pode reclamar tanto da sua vida se você não tem nem metade do perrengue que esse gênio da física passou. Porém passado o momento de desespero da sua baixa-estima, o que vem na nossa mente tirando a espetacular atuação do protagonista é que o filme foi falho ao mostrar a vida dele por um único e grandioso problema, o filme é baseado no livro da esposa, e embora tenha cuidado muito bem do marido, tendo sofrido demais, se passar como coitadinha acabou soando forçado em diversos momentos. Sabemos o quão duro é a vida que deixou de lado para cuidar dele, mas não necessitava algumas cenas que mostraram o teor sofrível e desgastante, e isso não só pode, como acabou custando diversos prêmios em festivais, o que é uma pena, já que se a história fosse algo mais enobrecedor da sua parte teria uma vivência bem melhor e mais bonita.

A cinebiografia conta a história do físico Stephen Hawking. A trama explora a sua vida como estudante da Universidade de Cambridge, onde conheceu sua futura esposa, Jane. Foi nessa fase em que ele começou a ter os primeiros sintomas da esclerose lateral amiotrófica (ELA), que lhe tirou os movimentos do corpo e a fala.

O fato de ser uma biografia já limita bem o trabalho de um roteirista, afinal ele não pode ser ousado o suficiente para inventar muita coisa, ainda mais pelo fato das pessoas estarem vivas, mas Anthony McCarten poderia ter trabalhado de uma forma menos forçada na composição de Jane Hawking, pois tirando as mulheres que já sofreram com alguma doença dos maridos, as demais pessoas não conseguirão normalmente assimilar ela como uma coitada frente à uma pessoa deficiente, claro que é nato que a pessoa sofreu, mas querer elucidar demais isso é um erro gravíssimo frente à tudo que mostram acontecendo no filme. Porém esse é o único defeito de um filme feito com comicidade e emoção, aonde o diretor James Marsh soube cuidadosamente amarrar as atuações magníficas num contexto maior e mais simbólico, claro que talvez um filme sobre as teorias mesmo de Hawking seria algo monstruoso e que poucos entenderiam, mas conhecer um pouco da sofrida vida do personagem já foi feito de forma bem trabalhada com técnica segura e movimentos tão suaves que geram uma sutileza nata de um espectador bem presente nos momentos, no caso, a esposa.

Falar da atuação do ganhador de praticamente todos os prêmios do ano é algo que não dá para explicar de tão boa que é, pois Eddie Redmayne, sem dúvida alguma pode escolher o projeto que desejar, e mesmo fazendo algo muito ruim, ainda vão lembrar de quão boa foi sua interpretação de Stephen Hawking que vão relevar, foi literalmente uma incorporação de personagem, com trejeitos mínimos perceptíveis frente à câmera, singularidades que se uma pessoa pegar o filme despercebida na TV vai achar que o jovem realmente tem todos aqueles problemas, literalmente chegamos a querer ajudar o personagem e por consequência o ator à fazer suas coisas, não dá para falar que foi perfeito, pois essa palavra ainda é abaixo do que o jovem fez. Felicity Jones foi infeliz no papel de Jane somente pelo fato que já frisei acima, de tentarem mostrar a protagonista como uma coitada e não como alguém batalhador que esteve sempre ao lado do marido nos momentos difíceis, pois a jovem fez uma interpretação até que considerável, e acabou sendo indicada à diversos prêmios, mas a culpa dos erros é do roteiro e não dela, e assim sendo alguns momentos soaram até falsos frente ao que mostra contradizendo o que falava, ou seja, talvez a direção pudesse ter mudado alguns detalhes que a jovem daria um show também, mas não ocorreu, então está levando algumas pedradas. Charlie Cox deu um ar meio estranho para o seu Jonathan, é contado em certo momento seus problemas, mas é outro que acabou soando como coitado na história e ficou falso em alguns momentos do filme, faltou um pouco mais de olhares para convencer, pois mesmo nos momentos emotivos e bonitos que está junto dos protagonistas, seu olhar triste chega a beirar piedade, e isso não é legal frente à um personagem. Algumas cenas de Simon McBurney como Frank mostram o quanto alguns professores são grandes mestres e esforçam a mente dos discípulos para um bem maior, mas como esses momentos não foram tão explorados, ele apenas soou mais como um amigo particular do que como o grande mestre por trás da mente brilhante do personagem principal, e isso também pode ser considerado uma falha, já que o ator é muito bom e merecia algo de maior destaque. E para finalizar, já que daria para falar de muitos outros personagens que foram importantes e não ganharam o devido destaque, vale a pena falar de Maxine Peake como Elaine, pois logo de cara a atriz pegou algo e fez toda uma vitalidade impactante que deveria ser mostrada na protagonista, e talvez isso até esteja no livro como algo que Jane gostaria de se enxergar e pôs na personagem como motivo para sua separação, ainda mantendo o lado de vítima, e a atriz fez tudo tão bem colocado que mesmo entrando somente no fechamento do filme, acabou agradando bastante.

Sobre o visual da trama, conseguiram montar uma cenografia clássica dentro de uma proposta não muito conservadora, e isso é bacana de ver, pois é o que costuma acontecer em demasia nos filmes britânicos, e raramente eles erram nesse conceito agradando tanto na quantidade de elementos cênicos para que cada cena tenha a simetria correta, os detalhes sem exagero, tudo ficando em uma pontuação clara e minuciosa de forma artística e soa bonito, mas faltou a ousadia que agradaria e chamaria atenção, por exemplo o que foi mostrado nas várias cenas de escadaria, tanto com os amigos quanto a com o bebê, que foram muito bem colocadas, e agradaram bem mais que as outras mais rebuscadas. Quanto da fotografia, o cinema britânico adora os contra-planos com luz estourando frente aos tons marrons em primeiro plano, é algo clássico que funciona de certa forma para dar personalidade aos seus filmes, mas não dá brilho nem para que os atores sobressaiam nem que o filme ganhe vida própria, talvez algo mais puxado para o pastel com destaque frontal daria uma vida maior e chamaria destaque não apenas para a boa atuação do protagonista.

Quanto da trilha sonora de Jóhann Jóhannsson é um espetáculo fora de série, com nuances puxadas para cada momento ser envolvente e interessante, ganhando charme e agradando demais, quando deram o prêmio para "Grande Hotel Budapeste" podemos dizer que a academia gostou mais do formato cômico do que algo mais sério e envolvente, que nos foi entregue aqui.

Enfim, um filme muito bem feito e que nos envolve ao mostrar toda essa vida de luta que segundo os médicos não duraria no máximo 2 anos, e já passados mais de 50 demonstram uma garra e determinação tamanha, tanto da pessoa Hawking como de todos ao seu redor, e souberam mostrar bem isso, tirando o pequeno defeito que falei que seria melhor ocultado da trama. Demorou quase um mês para chegar ao interior, mas fiquei muito feliz que numa sessão às 22 horas a sala estava lotada, significando que felizmente a grande maioria acabou não baixando o longa e foi conferir agora nos cinemas, apenas digo para todos que corram, pois como são poucas cópias, não deve ficar muito na cidade, mesmo dando público. Bem é isso pessoal, recomendo muito o longa para quem gosta de dramas clássicos, mas com uma pegada bem leve de comicidade que vai agradar com certeza de alguma forma tanto pela biografia quanto pelo trabalho feito, fico por aqui agora, mas ainda hoje irei conferir outro bem atrasado que não apareceu ainda em Ribeirão Preto, mas como estarei em São José do Rio Preto, vou conferir por lá, abraços e até mais tarde.


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