Contar a história da vida de alguém já foi tema de diversos filmes, alguns abordando problemas da infância, outros da adolescência, outros da juventude, muitos da vida adulta, e alguns com passagem pela velhice, mas quando um longa usa crianças fica um pouco complicado mostrar essas metamorfoses que o corpo e a mentalidade sofrem nas diversas fases, então o que fazer, a solução da maioria dos diretores é arrumar crianças de diversas fases parecidas, mas Richard Linklater não, ele é um maluco que quis fazer seu "Boyhood - da Infância à Juventude" contando 12 anos da vida de um garoto filmando ele, e os demais atores por reais 12 anos, gravando uma semana por ano, e montando o roteiro conforme ia acontecendo os fatos, claro já com uma base sólida do que desejava, mas o grande mote foi rolando ano a ano, e aí é que está o maior problema do filme, pois 1 semana de gravação, com teoricamente tudo que ocorreria naquele ano da vida da família não tem como ser desenvolvido, e a falta de um clímax geral aliado à conflitos e problemas na vida de uma pessoa (não me venha falar que os padrastos bêbados são conflitos) não acabam gerando um longa com precisão, fica morno demais, e assim o resultado até é um bom filme, mas que acabou sendo mais cheio de comentários pela loucura de se filmar as mesmas pessoas por tanto tempo do que uma história que comovesse, agitasse ou questionasse o público em si.
No longa acompanhamos 12 anos na vida de Mason Jr., ou MJ, entre os 5 e os 18 anos, da infância até o fim da adolescência, vivendo em Austin, capital do Texas, com sua irmã e os pais divorciados. Mason, o pai, parece mais infantil que o próprio menino, muitas vezes sumindo por meses com a justificativa de estar tentando deslanchar sua carreira musical; enquanto Olivia, a mãe, luta para terminar seus estudos e vive se apaixonando pelos homens errados.
Uma coisa que temos de falar com muita certeza é que o diretor Richard Linklater foi salvo pela genética das crianças que durante todos os anos mudaram muito visualmente, mas se tornaram adultos bonitos e todos deram interpretações satisfatórias para chamar atenção durante todos os seus momentos. E embora o roteiro tenha sido bem feito, a falta de conflito que na vida comum até funciona de uma pessoa que tem tudo acontecendo bonitinho, sofre uma ou outra discussão, bate em alguém, todos quebram um braço, batem um carro, brigam feio, e por aí vai, de modo que a temperatura do longa ficou sempre no mesma, e sempre que víamos algum problema que certamente geraria algum conflito ou choque no longa, que todos na plateia já ficavam aflitos para o que aconteceria, lá vinha o diretor na edição e já mudava de ano sem impactar em nada na trama. A edição funcionou muito bem para não ficar estranho as mudanças de ano, mas algumas são assustadoras e descompassam o longa, aparentando até de certa forma um erro de continuísmo. E mesmo com ângulos inusitados, a falta de diálogos mais incisivos e questionadores, que costumam ser um dos pontos fortes do diretor em seus trabalhos, o resultado final acaba sendo bacana, mas longe que faltou detalhes para se tornar uma trama realmente.
É interessante ver que mesmo o elenco adulto não mudando tanto visualmente, as mudanças temporais funcionaram bem e a maturidade que impregnaram para seus personagens deu um charme a mais na trama. Patricia Arquette foi bem na trama, mas muito longe de ser a ganhadora do Oscar, pois fez o tradicional, colocando expressão forte e trabalhando as entonações clássicas dentro do que a personagem pedia, mas poderia ter em algumas cenas emocionado mais e ter trabalhado os olhares também. claro que ela já merecia a premiação por outros papéis que fez, mas aqui foi algo simples e tradicional. Ethan Hawke caiu bem para o papel de um pai que vive viajando longe da família e que quando encontra com os filhos faz tudo o que não pode com a mãe, mas seu crescimento profissional nesses 12 anos também foi algo interessante e que acabou sendo mostrado na trama, poderia ter feito alguns olhares mais encaixados, mas saiu bem no geral. Podemos dizer que o jovem Ellar Coltrane foi melhorando sua atuação durante os anos e seu Mason passou a ter vida juntamente com seu crescimento e claro que acabou aprendendo muito durante os anos, mas o diretor poderia durante alguns anos ter dado mais técnica aos olhares do jovem para que passasse um pouco mais de sentimento. A filha do diretor, Lorelei Linklater já foi exatamente pelo lado inverso e acabou a produção de uma maneira tão tímida que nem parecia ser mais a garotinha viva e falante do início da trama, mas acabou saindo bem com tudo que fez, e deve em breve aparecer em mais produções com o pai famoso que tem. Dos demais como acabam participando da vida da família acabam fazendo apenas bons papéis, mas nada que chegue a chamar atenção, claro que os momentos de bebedeira de Steven Chester Prince e Marco Perella dão o que falar, mas como não tiveram muitas oportunidades para se destacar acabaram ficando apenas com a fama de rude e nada mais. Outro ponto legal de ver foi na cena da festa de formatura como algumas pessoas ficaram após vários anos, pois alguns atores engordaram, outros mudaram tons de pele e isso é bacana de ver nessas reuniões de amigos do passado.
A cenografia foi bem trabalhada, e com toda certeza matou a equipe artística para cada ano não cometer gafes de continuidade e ainda assim ter processo criativo para trabalhar com diversos elementos cênicos para representar as idades de cada personagem, e em 12 anos, claro que muitas tendências visuais mudaram, os diretores passaram a gostar mais de cada cor, e ficou bem bacana de ver elementos que costumaram marcar as épocas ficando em evidência, isso com certeza foi um ponto bem positivo de ver. A fotografia do longa ficou muito bonita, e junto com a cenografia, acabaram escolhendo locações bem pontuadas para chamar a atenção e isso já é um costume que o diretor abusa nos seus outros longas, aonde temos sempre uma boa valorização da natureza ao redor, procurando usar ao máximo a iluminação natural para dar as nuances de sombra e contraluz, algo que é bem bonito de ver mesmo.
No quesito sonoro, poderiam ter abusado mais das canções de cada época, que mesmo tendo uma pitada aqui outra ali, acabaria dando uma vertente inteligente e agradável, mas as canções usadas corresponderam bem, e auxiliaram o longa que tem quase 3 horas a passar de maneira bem tranquila sem cansar o espectador.
Enfim, é um longa tecnicamente muito bem produzido e que foi concebido literalmente como uma loucura, pois o diretor arriscou muito de suas fichas ao trabalhar secretamente com essa quantidade imensa de atores, e principalmente por ter crianças envolvidas, jamais se saberia como estariam em 12 anos, se gostariam de continuar sendo atores e por aí vai, mas o resultado agrada bem e se não fosse a falta de virar realmente uma história com problemas e uma vida mesmo contada, era garantido que todos adorariam e ganharia todos os prêmios a que foi indicado, mas do jeito que ficou deu apenas melhor atriz coadjuvante e com muito pesar ainda. Estou falando claro do Oscar, mas o longa foi feliz em diversas outras premiações e assim com certeza a equipe ficou feliz com o final. Bem é isso pessoal, encerro aqui minha participação no Festival Sesc Melhores Filmes, já que os outros que irão passar no Sábado e Domingo já conferi quando estreou, mas garanto que são bons filmes e valem a pena assistir, então compareçam, mas volto com a minha opinião das demais estreias que vieram para o interior, então abraços e até breve.
2 comentários:
Corrigindo: Melhor Atriz Coadjuvante!
Valeu Cardoso!! Corrigido!!
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