sexta-feira, 17 de junho de 2016

A Corte (L’hermine)

Costumo classificar filmes de tribunal como um gênero a parte, pois costumam ter vértices diferenciados de suspenses, dramas ou qualquer outro, usando um pouco de cada, de acordo com o gosto do diretor. Porém, nunca tinha pensado na possibilidade de um mini-romance acontecer num filme com essa temática, ainda mais focando completamente nesse cenário de um tribunal, mas sempre existem as primeiras vezes, e hoje foi um desses dias, pois "A Corte" acabou focando tanto na relação extra profissional dos protagonistas, ou como agiam com seus réus/pacientes, causando diferentes sentimentos, e porque não dizer paixões, que a trama do julgamento de uma criança de sete meses morta acabou ficando em segundo plano, mesmo com os ótimos depoimentos que poderiam levar tranquilamente o julgamento como um ótimo tema. Não digo que foi algo errado, mas a trama acabou invertida de tal modo que um julgamento cansativo de três dias na história, e de quase 2 horas de duração, acabou sendo inútil, e independente de qualquer coisa que acontecesse ali, a importância ficou somente nas duas cenas de um bar e no olhar final, ou seja, muito tempo perdido de filme que poderia ser facilmente resolvido como um curta-metragem bem bonito e interessante de se assistir.

A história tenta nos mostrar que Michel Racine é um temido juiz, presidente de tribunal. Tão rigoroso consigo mesmo quanto com os outros. É conhecido como “o Presidente com dois dígitos”, nome que lhe foi atribuído por suas sentenças serem sempre superiores a dez anos. Tudo muda no dia em que Racine encontra Ditte Lorensen-Coteret. Ela faz parte do júri popular que deverá julgar um homem acusado de homicídio. Há anos atrás, Racine amava essa mulher. Quase em segredo. Talvez, Ditte, tenha sido a única mulher que ele já amou.

A direção e o roteiro de Christian Vincent não pode ser descrita como algo ruim, mas sim como uma falta de adequação para com o tema que desejava seguir, pois não temos um filme ruim, apenas somos surpreendidos com algo tão fora do que o longa seguia que ficamos inconformados com o fim, pois até poderia haver o romance dos protagonistas, sua forte conexão com o passado e tudo mais, porém não tivesse um julgamento tão duro por trás, ou então invertesse tudo deixando o romance rolando de modo simples, mas o foco ficasse mais no julgamento, o que seria perfeito também, mas a bagunça ficou forte e acabamos mais frustrados do que envolvidos com tudo o que acabou acontecendo, e nem os belíssimos desenhos que nos remetem realmente a uma grande peça de teatro que é um júri, acabaram servindo pra muita coisa no filme. Ou seja, temos tantos elementos bacanas de serem trabalhados dentro do filme, e o que o diretor usa? Um romance fraco e sem muita continuidade para com todo o restante. Ainda estou inconformado do Festival de Veneza dar o prêmio de melhor roteiro para esse filme, pois a ideia até é boa, mas foi usada de modo tão superficial, que não vemos em momento algum o trabalho que a direção sequer quis usar com ele.

As atuações foram bem feitas, Fabrice Luchini está incrível com seu Michel Racine, tanto que acabou levando o prêmio de melhor ator em Veneza pelo filme, mas esperava mais de seu comportamento como foi descrito pelos demais da sessão do júri, que acabaria dando um tom mais impactante. Sidse Babett Knudsen também agrada nos momentos chaves com sua Ditte, inclusive ganhou o César de Melhor Atriz Coadjuvante, mas é quase um elemento surpresa na trama, pois de cara pensamos que o filme iria tomar um rumo, mas ao virar para seu lado acabamos tendo uma outra perspectiva, sendo sua grande cena mesmo a do carro indo para o hospital, e o fechamento do longa ao usar o figurino correto para o momento. Mas devemos a grande solução do filme para Eva Lallier que detonou na resolução completa da trama com apenas 2 cenas de sua Ann, mostrando-se assim uma excelente detetive explicativa de como funcionam as coisas, claro que isso fez parte do seu roteiro, mas a forma expressiva da garota resumiu toda a ideologia completa da trama. Iria falar um pouco mais sobre os atores do tribunal, mas nenhum tem importância para o rumo que a trama foi, então é melhor que quem for assistir após ler meu texto, foque somente nesses atores, pois a chance de decepção é menor, mas sem dúvida alguma as expressões de Victor Pontecorvo como Martial Beclin foram bem interessantes para alguém que estava sendo julgado.

Sobre o visual do filme, tivemos uma escolha bacana de um tribunal diferenciado do usual, que costuma causar mais tensão nos filmes, mas souberam ser singelos no que desejavam mostrar ali e de certo modo até acertaram em não enfeitar em demasia tudo, pois como já frisei muito acima, o que ocorre no julgamento em si não é importante. As cenas fora do tribunal foram mais importantes e por isso acabaram sendo mais produzidas, mostrando o estilo de cada personagem, e até mesmo uma boa noção do estilo como a protagonista respeita e atende seus pacientes no hospital, ou seja, funcionou como algo mais explicativo a parte cênica do que realmente o textual em si. Claro que os desenhos feitos durante o julgamento foram lindos de se ver, e até mostram bem como a artista ali capturou bem a essência completa do palco cênico de um julgamento, mas tirando o mote reflexivo, só foi um gasto a mais na produção, pois não funcionou para nada. Sobre a fotografia, não ousaram em nada, fazendo bem o básico de planos e contraplanos, todos bem iluminados sem sombreamentos para dar qualquer textura ou nuance, mostrando que a essência do filme ficaria por conta dos momentos e não de algo a ser mostrado realmente na tela.

Enfim, um filme que possivelmente poderia ser perfeito e envolvente, mas que acabou sendo bem mediano, ou seja, não recomendo ele mesmo com os bons momentos passados, que acabaram floreados demais no meio de algo que fugiu completamente da temática. Volto a frisar, a ideia foi excelente, mas mal desenvolvida. Bem é isso pessoal, volto daqui a pouco com mais um texto do Festival Varilux, então até breve.


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