É bonito ver quando diretores brasileiros trabalham com outros estilos sem ser a comédia banal e caricata que tanto marca nosso cinema nacional, e um dos diretores que vem tentando mudar isso, bem aos poucos, já que usa um modelo quase novelesco, é André Ristum. Depois de "Meu País", aonde ele trabalhou mais com a personalidade humana, mas colocando uma pontinha politizada aqui, outra acolá, aqui em "O Outro Lado Do Paraíso", ele já bota todas as cartas na mesa e mostra que a época do golpe militar foi algo duro frente às famílias mais pobres que tentavam ganhar sua vida, e claro permeia também a humanidade dentro da personificação de seus personagens. No modo geral, é um longa bem bonito de ser visto, e que poderia ser bem melhor se não focasse tanto nas imagens documentais sobre o que ocorria na política do país, o que de certa forma acabou transformando a história em algo novelesco demais, mas certamente mostra que uma família unida pode imaginar seu paraíso e buscar meios de conseguir alcançar uma melhoria para seu futuro.
A sinopse do longa nos conta que Antônio faz o que pode para conseguir dinheiro para o sustento do lar. Já tentou garimpo, bicos diversos, e agora pensa ter encontrado finalmente seu lugar: Brasília. Atraído pelas promessas do presidente João Goulart e pela ampla oferta de emprego, ele se muda para a capital com a esposa e os filhos. O sonho da prosperidade, no entanto, é interrompido pelo golpe militar e Antônio, envolvido com o sindicalismo, começa a viver um pesadelo.
A ideologia passada no filme é bem bonita de se ver, e acompanhar a história baseada no livro autobiográfico de Luiz Fernando Emediato é algo que nos leva a florear o quão dura foi a vida das pessoas que saíram do meio do nada para tentar uma vida melhor na capital do país e não se deram muito bem com tudo que sempre foi problemático por lá, principalmente nos anos 60. De cara a forma como o diretor André Ristum trabalha com a história até podemos julgar como sendo os primeiros capítulos de uma longa novela, mas como Emediato contou em uma entrevista a ideia maior é que esse realmente seja apenas o início de uma tetralogia com seus outros três livros. O que posso adiantar é que é algo vendável e interessante de ver na telona, mas infelizmente a bilheteria para empolgar e levar a ideia para frente não parece ter sido tão agradável. O estilo que o diretor usa de câmeras em ângulos diferentes, o trabalho de pesquisa bem colocado para as imagens casarem ao máximo com o tom do filme, o envolvimento cênico dos personagens caindo para os vértices corretos da trama são coisas bonitas de ver sendo mostradas, mas talvez poderiam ter ido direto ao cerne do problema, ou até mesmo colocado mais dramatização ao invés da inserção de tanta história, o que daria um teor diferenciado para a trama, criando algo mais fictício e envolvente, porém não seria a história de alguém, mas sim um leque mais amplo. De todo modo, o resultado feito pelo diretor é bem bacana de ser visto, e ficarei claro na torcida para que consiga tirar os outros livros do papel.
As atuações foram bem trabalhadas e determinaram o fluxo que o diretor desejava, mas é interessante observar que mesmo Eduardo Moscovis sendo o protagonista da trama, tendo colocado uma expressividade interessante de ser vista e trabalhado bem o seu Antônio, o vértice principal acaba se concentrando bem mais na forma sonhadora de Davi Galdeano com seu Nando, que afinal é o escritor da história do filme, e Davi não decepciona em momento algum, chamando a responsabilidade desde os momentos mais doces e sutis até os mais trabalhados e fortes que exigiram de sua interpretação não apenas trejeitos expressivos, mas uma certa vivência para com o momento/sensações que devia transmitir na tela, ou seja, é um ator interessante de ficar de olho, pois deve chamar atenção mais para frente. Simone Iliescu manteve uma personalidade forte para sua Nancy somente nos olhares, pois fala muito pouco na trama, mas isso não é algo ruim, pois assim como ocorre com toda mãe sabemos somente pelo jeito que nos olha, o que está sentindo ou querendo dizer, e aqui ela fez exatamente isso, agradando bastante. Maju Souza foi uma jovem bem interessante e de certa maneira atirada com sua Iara, e trabalhando com um estilo mais ousado e bem colocado, a atriz soube dosar personalidade com interpretação, o que é raro de ver em adolescentes no cinema hoje em dia. Os demais funcionaram mais como ligações para cada situação, e foram até que de certo modo importantes para a trama, mas não tiveram tanta expressividade para que pudéssemos destacar cada ponto seu, então de modo geral podemos dizer que todos tiveram um contexto positivo e podemos até dar um ponto mais destacado para as poucas cenas de Flavio Bauraqui, mostrando com seu Jorjão junto de Murilo Grossi como Padre Alberto, algo como sendo o início dos movimentos sindicais em Brasília.
O visual da trama é bem interessante, afinal temos o clima rural colocado na medida certa com as cenas que se passam em Minas Gerais, usando de figurinos clássicos, casebres rústicos e elementos bem singelos para dar o trato certo nas cenas, e ao mudar de cidade, procuraram incorporar tecnologia (com ótimas escolhas de elementos da época), introdução maior de livros para mostrar bem que a educação e melhores pessoas se fazem lendo, muitas obras ao redor da construção de uma nova cidade e com isso elementos mais secos e trabalhados, mas que ainda mantiveram um estilo mais rústico da essência familiar, e assim sendo ficou bem claro o ótimo trabalho da equipe de arte que construiu a cidade cenográfica e mostrou que um bom cinema se faz do zero. Como disse o trabalho de pesquisa foi bem feito para encontrar as imagens certas para usar nos momentos certos, mas poderiam ser menos usados que agradariam mais. O trabalho maior da equipe de fotografia foi na colorização, afinal misturar imagens de arquivo com cenas gravadas sem que o tom fugisse tanto é algo que nem sempre agrada, mas de modo geral ficou um trabalho interessante sem muito o que destacar.
Enfim, um bom filme que agrada pelo contexto completo, mas que poderia ser menos alongado e menos histórico demais, pois se trabalhado dentro de uma ideia ficcional romantizada pelas crianças teríamos um filme lindo, envolvente bem colocado dentro da proposta e que chamaria mais atenção do que o resultado final. Porém mesmo com esses pequenos defeitos, é algo diferenciado e que com certeza recomendo à todos. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje, mas volto amanhã com mais texto por aqui, então abraços e até breve.
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