É interessante como o cinema brasileiro funciona, se vem uma comédia novelesca boba e engraçadinha reclamamos, mas se colocam sátiras sem muito determinismo, também reclamamos, então o que queremos ver no mundo cômico? Sinceramente, não sabemos, pois vamos reclamar de tudo. Usando dessa filosofia satírica que o ruim é bom, afinal isso acaba ganhando diversos prêmios em festivais "filosóficos", a trama de "Porta dos Fundos: Contrato Vitalício" para ser "compreendida" basta ver duas cenas: a que Rodrigo, como jurado do Festival de Cannes, está junto com Miguel assistindo à um filme dramático completamente filosófico e Miguel ri de tudo enquanto todos assistem sérios, e a cena final dele vendo seu filme centrado enquanto todos riem da maluquice que acabou virando. Não costumo contar cenas aqui no site, mas sem esse comparativo tudo o que se falar do filme será mero merchandising para a trupe, então fiz questão de deixar explícito as duas cenas que devem ser vistas para entender aonde quiseram chegar com o longa. Digo isso não por ser um filme ruim, muito pelo contrário, nas cenas cômicas o longa funciona muito bem e diverte, porém é de um nível de bizarrice tão alto para satirizar o show business atual, que quem vai assistir esperando uma comédia simples é capaz de sair até irritado com o que verá, e de certo modo, muitos irão aos cinemas até esperando ver mais esquetes como é de costume da equipe do Porta dos Fundos na internet, e felizmente (ou infelizmente) não foi bem isso o que se apresentou, mas que funciona como filme, porém poderiam ter ido mais de leve no impacto inicial para um primeiro trabalho mais autoral nos cinemas.
O longa nos mostra que Miguel e Rodrigo são dois amigos que costumam realizar filmes juntos. Certa ocasião, um de seus filmes ganha um prêmio importante em um festival internacional. Animados com a premiação, os dois saem para comemorar e Rodrigo assina, em um guardanapo de bar, um contrato vitalício que garante que ele estaria em todos os filmes de Miguel dali para frente. No entanto, Miguel desaparece e só retorna dez anos depois. Quando reaparece, ele leva para Rodrigo, agora um ator consagrado, a proposta de um filme insano que pode destruir sua carreira.
Se no ano passado Ian Sbf foi aclamado pelo excelente trabalho no cinema com "Entre Abelhas", que conseguiu mostrar uma faceta completamente diferente Fábio Porchat, e agradou muito com as nuances diferenciadas dentro de "O Grande Gonzalez" na TV a cabo, todos esperavam algo diferenciado também do que acabaria levando para as telonas com a proposta do "Porta dos Fundos", claro que muitos estavam com medo de ter um longa abarrotado de esquetes que acabariam se conectando e transformando tudo em algo bem bizarro, ou até mesmo algo sem conexão alguma, que seria bem pior. Portanto a ideia trabalhada do roteiro que Porchat também assina junto do diretor e de Gabriel Esteves, acabou fugindo completamente da ideologia de comédia novelesca, mas também foge da proposta de um humor mais escrachado, e passa por horas dentro da tradicional comédia satírica e de escárnio, que não anda tão na moda, mas que fluiu muito no passado e grandes diretores acabaram se dando muito bem com o estilo, porém o público atual vai até conseguir se conectar bem com algumas piadas inseridas na trama, e claro com as boas sacadas envolvendo programas, revistas e até mesmo pessoas famosas, mas vai sair da sessão pensando: "será que eu entendi alguma coisa do filme?", daí que entra minha explicação no parágrafo inicial, que se você não entendeu nada e riu do que viu, o objetivo da trama foi contemplado, porém se você tentou entender e filosofou demais, talvez não tenha visto metade do filme que tentaram propor. Claro que isso é uma ideia completamente maluca, mas que de certa forma agrada e ao mesmo tempo incomoda.
Agora nessa bagunça que podemos chamar de uma forma narrativa própria, analisar as atuações é algo que vai muito além do que podemos desejar fazer, visto que cada um trabalha seu personagem da forma mais criativa possível e por horas nem sabemos aonde querem chegar com aquilo. Antes mesmo dos protagonistas, o destaque mesmo tem de ser dado para Júlia Rabello e Rafael Portugal como a preparadora de elenco linha dura Denise e Paulo que vira praticamente um bicho ao se transformar no "comandante alienígena", não digo que o que fazem é algo maravilhoso de ser visto, mas a bizarrice é tamanha ao ponto de que ambos (mais Portugal) se dedicaram ao extremo para mostrar o quanto alguns preparadores de elenco destroem os atores para entrarem nos personagens, e isso ficou muito bem feito na tela, claro que de uma forma exageradamente bizarra. Fábio Porchat já virou estrela, e sua comicidade diminuiu muito depois que passou a ter contratos milionários, mas depois do que fez em "Entre Abelhas", certamente será difícil incorporar um novo personagem complexo e tão completo como fez no ano passado, e dito isso, seu Rodrigo possui nuances dramáticas, mas sempre puxando para o lado cômico desesperado por holofotes, ele em geral acaba fluindo mais nas piadas que não são suas, e isso não é legal de ver vindo de alguém que tradicionalmente é um humorista, ainda acredito muito no seu trabalho, mas aqui decepcionou um pouco. Gregório Duvivier agradou mais nos momentos de insanidade de seu Miguel logo que vai para a casa de Rodrigo do que no restante da trama, pois logo fica um maluco simpático demais, do estilo que já vemos todos os dias ao nosso redor, de modo que se mantivesse o estilo louco completo que foi assim que voltou da abdução agradaria muito e teríamos um filme completamente diferente. Outro que poderia ter muito mais tempo de tela é Antonio Tabet com seu Otacílio, pois isso sim é que é um "investigador" de primeiro nível, sendo interessante demais ver seus questionamentos, e se ontem ele já funcionou muito bem na dublagem em "Procurando Dory" com seu Hank, aqui ele foi perfeito também, mas com pouquíssimo tempo para dar mais nuances ao personagem. Agora é fato que todo artista odeia o pessoal das revistas de fofoca, e deram um puxão de orelha gigante ao colocar Marcos Veras como o forçadíssimo e afetadíssimo Lorenzo Chantonelly, que não economizou em trejeitos para humilhar todos os que foram satirizados com seu personagem. Thati Lopes também foi usada com sua Fernanda para mostrar o quão chato é ver essas modeletes que vivem no Instagram, Snapchat e afins dando dicas de moda e mostrando tudo de sua vida, fazendo mil plásticas e tudo mais, claro que forçou a barra ao nível máximo com suas mudanças, mas de certo modo é bem isso o que vem acontecendo. E para finalizar as sátiras, ficou claro para todos empresários de artistas que não dão a devida atenção ao seu contratado, pelo jogo desesperado de telefone feito por Luis Lobianco com seu Ulisses, que sempre exagerando em interpretações jogadas consegue divertir, mas deu seu recado. Sobre as personalidades que apareceram para dar o ar da graça apenas, podiam fazer melhor ao menos!!
Sobre o visual da trama, foram caprichosos ao dar um visual bem trabalhado para que todas as cenas se encaixassem dentro da proposta, mostrando uma mansão cheia de frescuras que muitos artistas se gabam de ter, pagando caro por obras que sequer possuem qualquer utilidade, e muitas vezes são horríveis, criando uma cenografia absurdamente bizarra para o filme, com figurinos mais toscos ainda, mas também dentro da ideia original, e claro nas festas de premiações colocando diversos figurantes que aparentassem realmente gringos para não precisar ir nos locais gravar, e assim sendo, de certo modo conseguiram mostrar uma eficiência bem colocada dentro da proposta e agradando com conteúdo o trabalho da equipe artística, ou seja, simples e determinado sem muita frescura nem errando por exagerar aonde não deveria. No conceito fotográfico, a trama trabalhou muito no tom marrom do filme de Miguel que está sendo feito, e isso acabou tirando um pouco da comicidade da trama, já que comédias exigem cores mais vivas para fazer o público rir, porém esse estilo que usaram acabou dando mais nuances para os momentos mais "sérios" do longa e assim agradando razoavelmente.
Enfim, é um filme completamente absurdo, que pode soar agradável e fazer rir se for analisado minuciosamente, mas também pode ser odiado com grandes afincos por aqueles que esperavam uma diversão mais generalizada do começo ao fim. Ou seja, não é um filme que o público vai sair completamente feliz com o que verá, e sendo assim, não posso recomendar ele com todas as forças, pois a sensação que a trama passa é de algo que poderia ser bem melhor, mas optou por um caminho mais difícil de convencer aqueles que gostam das esquetes do grupo. Portanto vá ver, afinal o cinema nacional necessita também de bilheteria, mas não garanto que todos vão gostar, pois a ideologia do absurdo e do bizarro só funciona para quem gosta realmente desse estilo, mas volto a frisar, não é um filme ruim. Bem é isso pessoal, encerro essa semana curta de estreias por aqui, mas volto em breve com uma pré que irei conferir, então abraços e até mais pessoal.
2 comentários:
LIXO de filme!
Deveriam devolver o ingresso em dobro!!!
Olá amigo, também não é pra tanto... é ruim, mas dá pra sobreviver com o desenvolvimento das piadas do trailer! Abraços!
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