Há muito tempo venho falando que o gênero religioso/cristão tem tudo para lotar salas, mas é pouco explorado no cinema por os produtores não saberem como trabalhar bem sem precisar forçar a barra. Bem, dizia isso até hoje, pois após conferir "A Cabana" posso dizer que esse é o molde perfeito para funcionar de maneira envolvente sem muita dramatização, músicas para fazer o público lavar os cinemas, e muito menos excesso de pregação, colocando serenidade nas interpretações, dinâmica nas ideias, e claro, bons efeitos especiais para que tudo que o imaginário fantasioso do público possa aflorar e incorporar junto com a história que é contada. Ou seja, um filme que acaba sendo agradável de ver e que funciona bem dentro da proposta a que se prezou, e que vai envolver tanto quem for religioso quanto quem gostar apenas de um bom drama (e que não ligue tanto para o mote em si), pois a ideologia toda em si é bonita e consegue ser bem colocada/mostrada para todos.
O longa mostra que depois de sofrer uma tragédia familiar, Mack Phillips entra em uma profunda depressão, que o faz questionar suas crenças mais íntimas. Diante de uma crise de fé, ele recebe uma carta misteriosa que o convida para ir a uma cabana abandonada. Mack encontra então verdades significativas que transformarão seu entendimento sobre a tragédia que abalou sua família e sua vida mudará para sempre.
Nunca havia visto nada do diretor Stuart Hazeldine, mas aparentemente seu longa anterior "Exame" foi bem premiado lá fora e fiquei curioso para conhecer, e até acredito que tenha sido ganhador de diretor revelação lá em 2009, pois seu trabalho aqui é bem característico e desenhado de forma singela para chamar atenção. Porém é muito mais notável aqui ser um longa de produtor, tanto que na divulgação já colocam os longas de sucesso da equipe de produção, e ao ver todo o trabalho em questões visuais, efeitos, sintaxes por trás do roteiro, o que vimos não é um trabalho feito em cima do roteiro pelo diretor, mas sim de uma equipe maior para recriar tudo o que estava no livro best-seller de William P. Young. Não digo que isso seja algo ruim, muito pelo contrário, pois sendo produtor gosto de longas bem produzidos, mas faltou aquela essência que só um diretor que mande realmente poderia fazer, de comover e emocionar o público, fazendo arrepiar com cada nova cena bem imposta, e isso Stuart nem sequer passou perto de fazer. Ou seja, não vai ser aquele filme fervoroso e impactante que poderia causar, mas pela beleza e sutileza mostrada em cada cena, o resultado acaba fluindo bem e até agradando bastante com cada momento sendo bem trabalhado com metáforas e lições para que quem desejar aprender e/ou refletir algo consiga durante toda a projeção.
Sobre as atuações, nem tem como não começar por Octavia Spencer, que caiu como uma luva no papel de Deus ou Papai como aqui é tratado, ou ainda por Elouisa que gosta de sua forma feminina, de forma que a atriz que já levou o Oscar mostra que ali foi apenas o começo, vindo num papel melhor que o outro, e aqui encaixando personalidade, carisma e entonações vocais tão bem dosadas e muita simpatia acabou criando alguém que não dava sequer para imaginar, mas que agradou em cheio. Sam Worthington é um ator interessante, mas que vemos tanto em longas lotados de ação, que quando faz alguém calmo e dramático parece um pouco apático, e mesmo com todo o ceticismo em cima da crença de seu Mack, faltou para ele mostrar mais isso, não se entregando tão facilmente à tudo o que estava vendo, mas de certa maneira ele até que foi bem. Avraham Aviv Alush também incorporou muito bem Jesus, fazendo algo moderno e mais contextual, não ficando tanto com as características tristes que tanto vemos em longas que retratam Jesus, e o ator se mostrou bem colocado, chamando os trejeitos de forma responsável e agradando bastante. A brasileira Alice Braga fez uma Sabedoria tão séria e fechada, que chega a dar medo de suas atitudes iniciais, mas foi se adequando de forma tão bem encaixada que o resultado final acaba sendo perfeito. Brincaram um pouco com a beleza do Espírito Santo/Sopro Divino ou melhor aqui chamado de Sarayu, que foi belamente interpretado por Sumire Matsubara, dando uma característica bem diferenciada para o personagem, mas que com um tom de voz tão gostoso de ouvir, acabamos ficando encantados com a atuação da atriz. O cantor Tim McGraw fez bem suas poucas cenas como Willie, e felizmente não errou como ator singelo, porém o detalhe claro fica para sua canção no final em que a letra permeia bem a ideia completa da história, ou seja, devia ter ficado só cantando que seria melhor, mas acredito que no livro o personagem dele tinha mais importância. Radha Mitchel é praticamente um enfeite com sua Nan, fazendo caras e bocas nas cenas colocadas, mostrando que sim é uma cristã fervorosa, e que da mesma forma que Willie, no livro deva ser mais importante, mas aqui infelizmente acabou sumindo de cena tão rápido que por pouco não esquecemos dela. Das crianças, todas fizeram bem suas expressões, mostrando o dever cumprido para com as sensações de culpa e tudo mais para Megan Charpentier com sua Kate, mas sem dúvida alguma o destaque ficou para o carisma da pequena Amélie Eve com sua Missy, que infelizmente não pode ficar mais em cena, pois a garotinha daria muito show com suas expressões. Apenas para fechar o grande elo que mostra que o céu não tem distinção de etnias, afinal temos uma negra, um árabe e uma japonesa interpretando a Santíssima Trindade, para fechar o grupo, na versão masculina de Deus, temos um índio, e Graham Greene não decepciona nas suas poucas cenas, fazendo imposições expressivas bem colocadas, mas que não chega nem perto de tudo o que Octavia fez nas suas.
Agora certamente como disse no começo, por ser um longa de produtor, o filme contou com cenografias incríveis, trabalhando a cabana como um elemento a mais de dois ângulos, jardins maravilhosos bem simbólicos, uma carpintaria charmosa, lago espelhado para a cena de andar sobre as águas, uma gruta simples mas totalmente montada para a parte mais dramática do longa, e claro muita neve para simbolizar o clima frio que pairou sobre a família, ou seja, tudo bem detalhado, riquíssimo em detalhes para trabalhar as diversas metáforas/parábolas bíblicas de forma que a equipe de arte certamente teve muito trabalho para ficar com o resultado final incrível mostrado. No conceito fotográfico para ligar todas essas belas locações, a equipe trabalhou muito com sombras duras para contrastar os tons, e usando muito brilho para as cenas de Sarayu o resultado acaba sendo quase celestial para entrar no clima religioso, ou seja, algo bem feito para não errar mesmo com os muitos efeitos especiais/jogos de câmera.
Agora se temos também de reclamar de algo, mesmo com boas canções-tema, o longa falhou no ritmo musical orquestrado, pois longas religiosos geralmente apelam para músicas sentimentais, pianinhos de fundo e tudo mais que possa puxar o choro do público, e já disse que isso não é errado, pois cria um vínculo maior para o longa, e aqui, o filme é seco, simples e só adentra realmente com música sentimental em duas cenas que nem chegam a comover a fundo, ou seja, faltou um pouco mais de sentimento. Claro que como sou bonzinho, aqui tem o link com as canções do filme, incluindo a composta para o filme por Tim McGraw e interpretado por ele e Faith Hill.
Enfim, é um filme bem bonito, que mostra que o gênero cristão pode agradar outros públicos sem ser os fanáticos religiosos, basta ter uma boa produção por trás e criatividade por parte da equipe para querer trabalhar o algo a mais, e assim sendo, as boas mensagens/lições acabarão sendo mostradas cada vez para um público maior. Tenho certeza que o grande público-alvo, que são os religiosos irão ser atingidos em cheio pela trama e pela forma mostrada no longa, mas também acabo recomendando ele para quem gosta de um bom drama, mesmo que não seja um frequentador de igrejas. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje, mas volto em breve com a última estreia da semana, então abraços e até mais.
PS: Fiquei entre dar 7 ou 8 coelhinhos para o longa, mas faltou aquele toque que me fizesse lavar o cinema, então vamos de 7 mesmo.
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