Alguns filmes surgem meio que do nada na programação e quando chegamos ao cinema pra ver o que tem naquele horário podemos ser (bem ou mal) surpreendidos pelo resultado da projeção completa, e com uma história que poderia ser um mote secundário de qualquer folhetim novelesco das emissoras, "A Glória e a Graça" surge bem com essa proposta, não ousando muito em dramaticidade, mas também não pecando pela falta dela, e com uma história linear até que ousada, por mostrar uma parte da vida de travestis (com sua postura na sociedade, o ser "bem-sucedida" no emprego, mas sofrendo também com amor, leis e tudo mais), mas ao incorporar toda essa ousadia com algo blasé demais que é contar ou não para a família uma doença terminal, o recheio acabou desandando um pouco não atacando nenhuma das duas vertentes, ficando com tudo em cima do muro e azedando ao final quando resolveram que era necessário colocar efeitos visuais para enfeitar. Ou seja, se o estilo trabalhado fosse outro, o longa poderia ser incrível, dramático, emotivo e até funcionando como um elo cultural, mas da forma como foi apresentado, acredito que nem novelas fariam tão malfeito, ainda que não seja um filme que não valha ser visto.
O longa nos mostra que excluída da família por sua própria opção, Glória constrói uma vida com todos os matizes inaceitáveis pelos parentes. Passados muitos anos, ela recebe um telefonema de Graça, que tem dois filhos - uma menina de 13 anos e um garoto de cinco - e acabou de descobrir que sofre de uma doença terminal. Desesperada, percebe que não há mais ninguém para cuidar das crianças quando ela se for. Ela então se arma de coragem e resolve retomar contato com seu irmão. Ao reaproximar-se, descobre que Luiz Carlos virou Glória.
O ponto chave da falha da trama deve ficar entre o roteiro alongado que deseja atingir várias expectativas de um produtor, trabalhando mais motes do que deveria, e/ou, ser coeso para saber que rumos tomaria, e a direção perdida que pegou o roteiro e apenas montou o filme, sem dar quebras ou tornando o longa algo mais visceral de ser visto, pois o filme sim tem um potencial dramático, possui uma síntese que daria diversas discussões, mas não avança para lado nenhum, apenas mostrando tudo de uma forma superficial que acaba semidesenvolvida. Não digo que o diretor Flávio Tambellini tenha abandonado o longa ou algo do tipo, mas a verdadeira impressão é que o longa ficou inacabado e tiveram de completar cenas. Ou seja, o resultado de um roteiro solto com uma direção omissa acaba sendo algo que até vai representar uma classe (a dos travestis), mas que quem não for conferir esperando isso sairá bem desapontado com o que verá na tela.
Agora se temos de pontuar algo bem positivo na trama, podemos dizer que foi a escolha de Carolina Ferraz para viver a travesti Glória, pois com o tamanho da atriz, com sua voz grossa tradicional e ainda usando de um jeito desengonçado de andar e um estilo bem característico acaba que a atriz incorporou bem o papel e saiu mais do que perfeita em todas as cenas, nem parecendo estar num longa tão bagunçado, o que agrada demais de ver, e faz parecer que se o longa focasse só ali seria perfeito, pois a atriz arrasou sem dúvida alguma. Sandra Corveloni até possui um certo carisma e interpreta bem sua Graça, mas usando do trocadilho, sua personagem é bem sem graça, de modo que não comove sua doença e nem faz com que o público se conecte aos problemas do abandono dos pais das crianças, da relação conturbada com o irmão e muito menos da forma que encara a doença, ou seja, talvez até tenha sido um problema da direção de atores para com o trabalho da atriz em desenvolver o personagem, mas acabou não dando liga. As crianças, Sofia Marques e Vicente Moreno até trabalharam bem seus personagens, Papoula e Moreno, mas foram singelos demais, e por bem pouco não acabaram tendo subtramas como uma novela, o que desandaria mais ainda o longa, mas ao menos é notável que cortaram bem suas cenas para que a fluidez seguisse ao menos. O mesmo podemos dizer de Carol Marra como Fedra e Cesar Mello como Otávio, pois ambos até possuíam boas histórias para serem colocadas no longa, mas se só o pouquinho inserido já não encantou e atrapalhou um pouquinho todo o funcionamento cênico, imagina uma desenvoltura maior dos atores!! Ou seja, o elenco até foi empenhado para as cenas, mas a bola de neve se espalhou tanto no meio do caminho que a avalanche nem desceu do cume da montanha.
No conceito cênico o longa trabalhou pouco em contextualizar o ambiente do filme, pois mostra vários lugares do Rio de Janeiro (só sabemos pelas falas dos nomes de bairros pelos protagonistas, já que nada chamativo aparece) mas nada que chegue a impressionar, como um restaurante bem interessante que a dona é Glória, com diversos elementos para mostrar que é algo chique e que a personagem conseguiu subir de vida, um apartamento bem montado mas que mantém a essência antiga da família, bares musicais simples, um hospital simplíssimo que nem aparenta ter sido filmado em um hospital, e uma escola que não diz nada demais, além de cenas gravadas em um parque, ou seja, a equipe de arte foi bem econômica e não exagerou em nada, mas também não mostrou nada que impressionasse. Quanto da fotografia, o longa não erra, trabalhando cores e iluminações corretas para criar o ar dramático, mas ao colocar efeitos especiais bizarros em duas a três cenas, o resultado acaba quase desandando mais ainda.
Enfim, é um filme que poderia ser bem melhor pela proposta que desejava passar, mas que também não é o pior longa que já vimos nos cinemas, então quem gostar de algo mais alternativo talvez até possa achar interessante mais alguns momentos do que quem gosta de um cinema mais clássico. Portanto deixo a recomendação com várias ressalvas para quem for conferir. Bem é isso pessoal, ainda faltam mais alguns longas atrasados para conferir nessa semana, então abraços e até breve.
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