terça-feira, 2 de maio de 2017

Além Das Palavras (A Quiet Passion)

Há longas que reclamamos de cortarem cenas demais, mas há alguns que ficamos realmente pensando o que deu no diretor de deixar tanta coisa chata e que dê tanto sono no espectador. Não ligo que a pessoa tenha escolhido ser reclusa (e não casar), nem tão pouco não tenha fé e acredite em religiosidades como foi Emily Dickinson, mas pra tudo tem um limite de rancor e a política da boa-vizinhança é algo que se deve manter mesmo quando não se gosta de alguém, e sabemos bem que fazer uma biografia nunca é algo fácil, pois é preciso retratar coisas boas e ruins do "homenageado", mas o que o diretor fez com a personagem em "Além Das Palavras" é algo que mesmo sua poesia sendo gostosa e interessante de ouvir por toda a sintonia com o que viveu e pensou, não conseguimos amenizar em nada a dor que o rancor acabou dominando na pessoa, fazendo sua doença evoluir. Ou seja, é um filme de 125 minutos que se me falassem que fiquei 200 na sala, acreditaria facilmente, pois chega a cansar, mesmo oscilando pontos bons com ruins, e assim sendo faltou muita dinâmica para que o longa agradasse.

O longa acompanha a biografia de uma das maiores poetisas americanas de todos os tempos. Narra com intenso vigor o período que vai da juventude de Emily Dickinson no internato até os seus últimos anos, vivendo como uma artista reclusa e ainda não reconhecida. O filme aborda as rejeições, repressões e paixões que influenciaram a trajetória da escritora, bem como os relacionamentos com sua família e outras pessoas que marcaram profundamente a sua alma e a sua obra.

Que o estilo do diretor e roteirista Terence Davies é algo mais calmo, sem quase quebras/cortes duros nas filmagens e que dificilmente o longa agrade um público mais comercial já sabíamos, mas que ele seria capaz de criar um longa tão lento e quase sem nuances vivas para qualquer público como fez aqui nem poderíamos imaginar, pois a ideia da trama não é ruim, afinal já disse algumas vezes e volto a repetir, que todos personagens da história (escritores famosos, colonizadores, presidentes, religiosos e tudo mais) merecem ter uma biografia para que o público possa conhecer mais de onde vieram tais ideias, mas Emily escolheu ser chata por estilo e o diretor conseguiu a deixar insuportável, de modo que sua obra acaba sendo quase um martírio completo, mesmo contendo belezas incríveis nas passagens narradas dos textos da poetisa e junto delas mostrando uma cenografia minuciosa que acabou acompanhando o longa épico. Ou seja, era pra ser um filme que se colocassem um mínimo de dinâmica mais interessante de acompanhar, ficaria incrível de ver, mas que foi penando tanto por seguir o mesmo estilo de vida da poetisa que no final a amargura completa dela, mesmo que com pitadas cômicas bem colocadas acabam mais dando sono do que enobrecendo a obra, e assim, o filme não flui bem e nem chega a lugar algum, sendo apenas uma exibição da vida dela, sem criar nenhuma perspectiva ou mostrar algo nobre que tenha feito sem ser seus poemas (publicados a maior parte pós-morte, afinal na época não se aceitava quase nada de mulheres).

Não posso afirmar 100% que o problema do longa tenha ficado somente nas mãos do diretor, pois todos os atores não pareceram dispostos para os personagens, dando tons bem colocados, mas que faltavam de um fechamento de cena, deixando sempre aberto cada momento com olhares colocados fortes e frios, que não abriam possibilidade para que o longa incorporasse algo a mais. Os primórdios da trama ficaram a cargo de Emma Bell, que é mais conhecida por papeis em longas de terror, mas seu tom dramático caiu bem para a jovem Emily, e talvez se o longa focasse mais nessa época, talvez a dinâmica tivesse ocorrido melhor, pois a atriz mostrou uma boa desenvoltura cênica e chamou a responsabilidade para si diversas vezes. Mas o filme foca mais na maturidade de Emily, e isso coube a Cynthia Nixon, que é mais conhecida por seus papeis em séries, principalmente por sua Miranda em "Sex and The City", e aqui ela acabou exagerando em caras, bocas, trejeitos, movimentações corporais e tudo mais que pudesse, deixando o texto mais desenvolvido para os momentos em off, o que não é legal de ver, e com essa pegada lúdica demais, a atriz acabou destoando um pouco a personagem, e como já disse várias vezes, cansando o espectador, fazendo com que o interesse na história também fosse se perdendo, o que é péssimo para qualquer longa. Todos os demais atores tiveram momentos bem conectados com a ideia completa da trama, mas nenhum chegou a causar nada que fosse chamativo para pararmos e fixarmos o olhar nele, claro que temos de destacar as boas cenas de Catherine Bailey com sua Buffam toda a frente para a época, a serenidade de Jennifer Ehle com sua Vinnie e os ótimos enfrontes bem colocados de Keith Carradine como o pai da protagonista Edward, mas como disse todos apenas apareceram, sem muito o que ficarmos parando em suas cenas e observando.

O século 19 é daqueles que os diretores de arte correm quilômetros quando um diretor chega para oferecer trabalho, pois se não trabalhar bem os detalhes, mesmo que em ambientes completamente fechados, acabam falhando feio e não situando nada na trama. E aqui, embora tenham elaborado um bom plano cênico, tivemos muitos detalhes crus e jogados na tela, além de quase amarrem todos dentro da casa para não precisar elaborar a cenografia externa (e em uma das cenas do lado de fora de alguma casa vemos uma fachada completamente fora de época para piorar as coisas), ou seja, o filme até trabalhou bem num contexto fechado, com figurino correto, maquiagem, "festas" e elementos cênicos bem corretos, mas como a trama só fica ali dentro, foi algo pequeno demais para agradar, e poderia fluir muito mais que não ficaria fora do orçamento. Agora se temos de elogiar algo da produção, com toda certeza temos de ser coerentes e falar da forma incrível que ficaram as iluminações da equipe de fotografia, toda trabalhada em pequenas luminárias e velas, que deram um tom belíssimo de observar e que criaram perspectivas bem clássicas da época, ambientando cada momento e criando vertentes que poderiam ter sido mais trabalhadas.

Enfim, é um filme que poderia seguir diversos rumos, mas que escolheu o pior de todos, e com isso ao invés de enaltecer os ótimos poemas da poetisa, sua forma de escrita diferenciada, e até mesmo seu sofrimento com a doença, optou por colocar a essência de sua revolta e reclusão como tema mestre e assim cansar mais do que agradar. Portanto está longe de ser um filme ruim de assistir, pois como conceito de época, por mostrar um certo lado de mulheres que vão contra os rumos da época até funciona, mas quem for conferir, vá preparado para um longa bem alongado e cansativo, pois aí quem sabe já sabendo o que esperar possa curtir um pouco mais, mas de forma alguma posso recomendá-lo como um longa para quem quer apenas passar uma sessão interessante no cinema, pois temos muitos outros longas melhores para isso. Bem é isso pessoal, encerro aqui essa semana bem curtinha de estreias, mas volto na próxima quinta com mais filmes, então abraços e até lá.

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