terça-feira, 6 de junho de 2017

Paterson

Hoje muitos vão ler meu texto e falar que estou indo completamente contra tudo que já fui contra, para começar "Paterson" mostra o cotidiano do personagem pacato Paterson que mora em uma cidade pacata chamada Paterson por uma semana seguida, ou seja, sem quase nenhum ponto culminante para que aconteça algo chamativo, depois temos um longa que mostra poesias quase sem nenhuma rima para embelezar o texto, ou seja, não temos nenhum expoente didático para mostrar, então se juntarmos tudo o resultado seria algo quase que impossível de aguentar, correto? Ledo engano, pois o filme acaba suave e gostoso, com uma proposta até que bem ousada, pois acabamos quase como aquelas velhas fofoqueiras observando a vida do cara, sabendo aonde ele vai agir, como vai fazer, e até onde pode dar qualquer tipo de "cagada", ou seja, tudo passa a ser simbólico e funciona de maneira bem fácil, sendo um longa barato, bonito e bem colocado dentro da possibilidade, mas claro que dependeu da boa química e qualidade dos dois protagonistas (ou contaria três com as ótimas caras do cão?), e com isso se antes eu reclamava desse estilo, agora sei quando é possível acertar a mão para agradar!

O longa nos situa em Paterson, Nova York, EUA. Com o mesmo nome da cidade, Paterson, motorista de ônibus, diariamente repete uma rotina simples: faz a sua rota observando a cidade que se revela pela janela e ouvindo fragmentos de conversas que o rodeia; escreve poesias em um caderno; passeia com o cachorro; para em um bar, bebe uma cerveja e, depois, volta para casa para encontrar a esposa, Laura. Ao contrário do marido, o mundo de Laura está sempre mudando. Ela tem novos sonhos todos os dias. Há uma troca: ele apoia as ambições dela; ela encoraja o seu talento para a poesia. Derrotas e vitórias de um casal que se ama.

O trabalho do diretor e roteirista Jim Jarmusch é sempre algo que funciona de forma estranha, e é daqueles oito ou oitenta, não tendo como ficar no meio do caminho, pois por mais incrível que possa ser, ele sempre coloca um ritmo de camadas e velocidade abaixo do comum, com personagens sempre se contrapondo e/ou complementando, e que geralmente acaba cansando, mas quando acerta a mão na escolha dos protagonistas e sua história consegue permear essas camadas fluindo para fora da tela, não tem aquele que não se divirta e adentre a proposta quase que batendo um papo com o formato completo, e adequando o resultado completo para algo que passamos a gostar até mais do que imaginamos. Como disse no começo, tudo aqui tinha possibilidades para dar muito errado, mas acertou de tal maneira que acabou ganhando a Palma Dog em Cannes (não por menos, afinal a interpretação do cão Nellie com seu Marvin é sensacional) entre outros bons prêmios que venceu e recebeu indicações, pois a cada novo plano uma nova mensagem era passada e adequada para que os protagonistas nos envolvessem com ela.

Dentro do conceito interpretativo, a escolha de Adam Driver para o papel de Paterson foi mais do que certeira, pois se existe um ator pacato, com cara de sono e que remete a paciência em forma de pessoa é ele, tanto que inicialmente chegamos até ficar incomodado com o que faz em cena, mas depois vamos nos acostumando e aceitando completamente que é a personalidade do personagem, e que o ator não quer desenvolver ela acima do que lhe foi pedido, acabando ficando por vezes até monótono alguma de suas repetições, mas é do papel, e o acerto assim acaba iminente. Golshifteh Farahani ficou bem sexy e interessante com sua Laura, e trabalhada como aquela mulher amorosa que anseia seu futuro, mas que também quer o sucesso do marido acaba agradando e ficando bem pontuada também, mas claro que suas loucuras visuais fazem a diversão do público, e assim sendo mostra que também é uma boa atriz. Já falei de Nellie, mas volto a frisar que a cachorrinha foi sensacional em cena como Marvin, fazendo caras e latidos, agradando na medida certa, merecendo o prêmio póstumo em Cannes, pois após as filmagens foi descoberto um câncer e acabou morrendo antes de ganhar seu maior prêmio com 8 anos de idade. Dos demais atores temos de dar destaque claro para todos os atores do bar, principalmente Barry Shabacaka Henley com seu Doc, e na garagem do ônibus para as ótimas cenas cômicas de Rizwan Manji com seu Donny, mostrando que não devemos nunca perguntar para uma pessoa como ela está, pois, o assunto pode se estender mais do que você deseja.

A equipe de arte não teve grandes anseios, mostrando claro o visual da cidade de Paterson, com seus parques e cachoeiras, um bar de jazz bem ambientado, a casa dos protagonistas simples, mas dentro do conceito proposto com um porão de criatividades, e um cinema de rua/arte bem simples e interessante de se ver, além claro do ônibus que o protagonista Adam Driver (usando da piada pronta de seu sobrenome) teve de aprender a dirigir para ser um motorista, que mesmo sendo bem velho teve seu charme mostrado. Dentro dos objetos cênicos chamativos tivemos o caderninho de poemas (os quais foram criados especialmente para o longa por Ron Padgett), um violão ornamentado, diversas cortinas coloridas, uma caixa de correio sempre caída (e que mostram o motivo divertidíssimo). A equipe de fotografia ousou muito pouco, trabalhando poucas cores, usando mais o preto e o branco para contrastar a vida monótona da cidade, e colocando um ou outro elemento de cor diferenciada para tentar dar uma leve agitada, mas nada que fosse expressivo demais.

Enfim, um filme simples, mas muito bem feito, que agrada tanto quem gosta de algo mais conceitual, quanto quem deseja ver algo diferenciado, e sendo assim, mesmo quem não curtir poesias e cotidianos (como era esse Coelho que vos digita sempre) vai acabar saindo bem feliz com o que verá na telona. Bem é isso pessoal, encerro por aqui minha semana cinematográfica, mas amanhã já volto com o primeiro texto do Festival Varilux de Cinema Francês, então abraços e até bem breve, pois agora vocês vão ficar até cansados de tanto texto que irei publicar.

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