Muitos falam que o cinema argentino não entrega filmes ruins, e claro que temos de colocar uma vírgula nisso dizendo que o cinema argentino que exportam para outros países não tem filme ruim, e assim podemos seguir com o que temos de falar, pois dito essa verdade pura, é quase impressionante o resultado que vemos em "O Cidadão Ilustre", com uma faceta tão divertida, tão dentro do que vemos realmente acontecer com muitos famosos, e principalmente a história toda é montada do jeito que se espera, como um livro, falando de um escritor que usa sua história (verdadeira ou não?? Isso fica como tarefa de casa como diz o próprio protagonista) para ir moldando a trama, ou seja, vamos conhecendo a história de uma forma tão bem coesa, assimilando a mesma raiva que o protagonista adquire (afinal quem conhece qualquer cidade pequena sabe que é bem assim que funciona, não pode o Zé ficar meio famoso, que vão achar que esqueceu de fulano, beltrano já fica com ciúmes, tudo o que faz é errado, e por aí vai), e sendo assim com muita vivacidade, o resultado final quase nos engana, mas é entregue da maneira mais plena e bem colocada possível, agradando bastante, mesmo com algumas leves derrapadas, mas se você gosta de uma boa Comédia com C maiúsculo mesmo, essa é a pedida.
O longa nos apresenta Daniel Mantovani, escritor argentino vencedor do Nobel de Literatura, que vive na Espanha há 40 anos. Quando o prefeito de Salas, decide homenageá-lo com uma Medalha de Cidadão Ilustre, ele vê uma chance de retornar à cidade natal que deixou na juventude, mas que sempre serviu de cenário para os seus romances. Mas, logo ao chegar, percebe que a ideia pode não ter sido boa. É ele isso vai descobrindo por ter levado para os romances, também, alguns dos personagens reais da cidade.
São tantas boas sacadas que os diretores Gastón Duprat e Mariano Cohn fizeram em cima do roteiro de Andrés Duprat que fica até difícil falar de cada uma sem soltar um grande elogio, e principalmente, dizer que qualquer coisa dita vira um spoiler (aliás já tentei começar o texto de três maneiras diferentes, e essa foi a que conteve menos spoilers do longa), pois a grande sacada é ir descobrindo cada personagem da cidade, ir conhecendo a pacata cidade que mesmo sendo minúscula todos preferem andar de carro, moto ou qualquer outra coisa, que possui associações criminosas de pintores, e por aí vai, ou seja, tudo de insano acontece sem virar um filme tosco americano. Não digo que a perfeição é completa, pois isso seria forçar a barra demais, mas o longa soa tão divertido, e verdadeiro, que não queremos que acabe na mesma intensidade que desejamos que acabe a semana do protagonista na cidadezinha para ver que rumos tudo vai tomar, ou seja, euforia para saber o resultado, mesmo que isso seja triste por ser o final do longa. E dessa forma o resultado final pode até chocar inicialmente, mas vai valer a pena conferir.
Sobre as interpretações, é fato que Oscar Martinez briga com Darín como os melhores atores argentinos (sou pretensioso em afirmar que prefiro muito mais Darín que Martinez, mas isso é gosto pessoal!), e aqui seu Daniel é bem pautado, sem forçar expressões, conseguindo dominar a cena com uma boa desenvoltura, mas é sereno demais com tudo o que vai acontecendo para cima dele, pois dificilmente alguém suportaria tanta pressão sem mandar metade da cidade pra um lugar não tão amistoso, e isso é a maior falha no estilo dele, embora com o final tudo possa ser melhor explicado (mesmo que já saibamos do final muito antes dele acontecer). Agora se temos de pontuar alguém que saiu do eixo exagerando demais é Dady Brieva que desconhecia, e pretendo me afastar mais ainda de algo que faça, pois, para fazer rir, ele não força a barra, ele entorta ela inteira com seu Antonio, soando por vezes até sem noção de tão forçado, ou seja, poderiam ter economizado um pouco com o personagem. Manuel Vicente certamente já morou em cidadelas, ou fez uma pesquisa monstruosa para compor seu prefeito Cacho, pois é a cara de qualquer prefeito sitiante que só vive de eventos e morre de medo dos afortunados da cidade, divertindo mesmo que exagerando em alguns momentos. Dos demais personagens todos tentam aparecer um pouco na trama e até chamam a atenção, mas não chega a ser algo que mereça muito destaque tirando os trejeitos "amorosos" e "raivosos" da Irene interpretada por Andrea Frigerio, o ar sedutor e desesperado de Julia feita por Belén Chavanne e até a forma abrupta de Marcelo D'Andrea com seu Romero acaba agradando.
Dentro do conceito cênico, a grande sacada do filme foi a escolha das locações para que o ar interiorano dominasse realmente, com casas que parecem ter parado no tempo, os clubes e palestras feitas de forma bem adaptada, e claro as famílias que enriqueceram com casarões ornamentados destoando completamente do restante, mas com muitos elementos mostrando o que fizeram para isso, ou seja, um gracejo da equipe de arte que montou bem as nuances e deixou que o texto falasse sozinho, sem necessitar de grandes enfeites. A fotografia focou em ser determinante no tom para dar a dramaticidade certa nas cenas, claro que sem tirar o ar cômico, e com isso não vemos excessos de cores e nem de sombras, ficando bem no meio do caminho.
Enfim, é um longa bem divertido, que consegue agradar do começo ao fim, trabalhando bem com a essência da literatura dentro do cinema, e que quem gosta de longas singelos, bem feitos, que até forçam um pouco para que a diversão cômica aconteça, vai sair muito contente com o que verá na telona. Portanto se gosta de boas comédias, essa é a recomendação dessa semana, que entra em cartaz no Cinema de Arte do Cinépolis Santa Úrsula em Ribeirão Preto. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje, com a última estreia da semana no interior, mas volto amanhã com mais uma pré-estreia, então abraços e até breve.
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