sábado, 26 de agosto de 2017

João, o Maestro

É interessante como funciona bem o gênero biográfico no cinema, pois na maioria das vezes conhecemos tão pouco os protagonistas, que acabamos nos surpreendendo com cada detalhe minúsculo que nos apresentam, e que muitas vezes nem sabemos como a pessoa ficou famosa ou doente, e ao final ficamos pensando nossa como a pessoa podia ser assim. Com "João, o Maestro", no trailer já era possível ver a obsessão pela música clássica que o protagonista já tinha desde pequeno, e que com o passar dos anos só foi ficando mais forte ainda. Claro que muitos brasileiros (e estrangeiros) conhecem o maestro e músico João Carlos Martins, com suas mãos que chegam a arrepiar, mas sequer pensava como a doença e/ou acidentes teriam transformado ele, ou seja, o longa serviu, e muito para conhecermos a história desse homem, que sim teve muitas oportunidades em sua vida, fez muitas loucuras, mas que deu literalmente seu sangue para que a música clássica fosse tocada para todas as classes atualmente com projetos bonitos (que poderiam sim ter sido mostrados mais no longa) e que vão emocionar o público ao final da exibição, fazendo com que alguns chorem, outros aplaudam durante os créditos, mas que principalmente vai tocar com boas doses clássicas. Claro que o filme possui muitos defeitos, os principais no ritmo do miolo, algumas quebras repentinas de época, e até alguns exageros casuais e costumeiros de biografias para enaltecer o protagonista, mas muito além disso, o longa acaba sendo bem interessante e vai agradar quem gosta do estilo.

A sinopse nos conta que João Carlos Martins era uma criança com sérios problemas de saúde. Por conta disso, teve uma infância reclusa. Mas um belo dia, o piano entrou na vida de João. A partir daí, surge um garoto obstinado, que, em poucos anos, se transforma em uma das maiores promessas da música erudita mundial. No momento que passa a ser reconhecido pela comunidade artística internacional, João sofre um acidente que afeta um nervo de seu braço e interrompe sua carreira. João não desiste e volta a tocar, mas a paralisia da mão piora e o impede de continuar. Dessa forma ele encerra sua carreira e vai se envolver com a política, onde é acusado de fraude fiscal. Quando tudo parecia estar perdido, João resolve retomar sua carreira musical e faz um enorme sucesso. Mas, por ironia do destino, João é agredido durante um assalto e sofre lesão cerebral que afeta todo seu lado direito. As dores são insuportáveis e os médicos decidem cortar o nervo da sua mão direita. Usando apenas a mão esquerda, ele realiza inúmeros concertos pelo mundo, o que causa sobrecarga na sua mão e causa um câncer. Sem desistir da sua paixão pela música, ele acaba se tornando um maestro.

Bem, se você não conhecia a história, com essa sinopse completa que o site oficial liberou praticamente já sabe de tudo (como não li nada antes de conferir, me surpreendi com os dois pontos de clímax já citados no texto), porém isso é mero detalhe, pois o grande feito do diretor e roteirista Mauro Lima ("Meu Nome Não É Johnny", "Reis e Ratos", "Tim Maia") foi amarrar a história com ótimas interpretações e boas nuances de cada momento, de modo que o filme mesmo errando (tentando sempre exaltar os defeitos do protagonista como algo bom, mesmo a obsessão sendo algo completamente ruim, a traição, etc.) acaba soando versátil e levando às consequências de fato como um filme duro, mas ao mesmo tempo doce e interessante de se acompanhar. Ou seja, seguindo o tradicional estilo de biografias, ele vai fluindo e desenvolvendo com os momentos tensos de todas as fases do jovem João, passando pela sua infância, juventude, maturidade e até chegando aos dias atuais (com a participação do verdadeiro João nesse caso), de modo que nesses entremeios vai mostrando personagens importantes como os professores, pais, mulheres, agentes e amigos, não ousando, mas também não atrapalhando com nada. Enfim, o diretor foi sucinto, pois com a quantidade de acontecimentos o longa viraria fácil uma série de 10 capítulos bem alongados (não duvido de em breve aparecer na TV nesse formato, mas com menos capítulos!), e com isso a história anda bem, mas certamente poderia ser melhor se deixasse levar sem muita comoção para mostrar o quão bom foi e é o maestro.

Sobre as interpretações, temos de ser bem coerentes, pois a fase infantil do protagonista, vivida por Davi Campolongo foi doce e mesmo que mostrasse que desde pequeno João teve tinha muitos problemas para lidar, o semblante bem coeso que o garotinho conseguiu mostrar agradou bastante na tela, na sequência entra em cena sem dúvida alguma a melhor interpretação que Rodrigo Pandolfo já fez em todos os seus trabalhos, pois o ator soube dosar o temperamento forte do protagonista com desespero por desenvolturas, e claro que com uma boa maquiagem e expressões bem semelhantes ao que veríamos mais para frente, o ator foi sensato no tom e acabou chamando muita atenção, nem parecendo com outros erros que já fez em outros filmes, e para a última fase de João, Alexandre Nero começou bem devagar (e por bem pouco não cansou o público), criando poucas dinâmicas, mas mostrando ainda assim uma boa personalidade casual, criando e mostrando as principais características mais humanas do personagem, e claro mostrando que é um ator de grande nome, que certamente ainda não explodiu (mesmo com muitos personagens principais já na carreira), mas vai explodir brevemente. Dos demais personagens, a maioria apareceu bem rapidamente, mas tivemos grandes cenas com Caco Ciocler como um professor bem rígido, Giulio Lopes como o pai de João, sempre sereno nas boas colocações e ensinamentos, trabalhando como um português bem cheio de sotaque, mas sem dúvida o grande destaque ficou a cargo de Kevin Sebastian como o agente e amigo Jay Hoffman, que trabalhou boas nuances junto do protagonista e foi melhorando a cada ato num bom crescente. Quanto as diversas mulheres que o personagem teve, a que ficou mais tempo em tela foi Alinne Moraes, e com seu semblante tradicional de humor duro demais, acaba nem chamando tanta atenção nos conceitos expressivos de sua Carmen, de modo que talvez uma atriz menos dura agradasse mais.

Sem dúvida alguma, o grande feito do filme foi ter toda a produção filmada em diversos países para retratar exatamente cada momento do personagem principal, trabalhando bons elementos cênicos (embora os dois acidentes tenham soado falsos e forçados demais!) e principalmente colocando figurino e cenografia em primeiro plano para que tudo funcionasse perfeitamente, ou seja, uma direção de arte impecável de primeira linha, que vai sim chamar muita atenção de quem for conferir o longa. A fotografia ousou bastante com sombras e tensões, para retratar cada momento mais tenso com tons fortes e escuros, de modo que o filme acabou mesclando ao mesmo tempo a doçura de alguns momentos mais leves, sem deixar de pontuar cada ato com visceralidade para chamar atenção.

Enfim, é um filme bem feito, com um trabalho artístico primoroso, que mesmo quem não for fã de música clássica vai acabar se conectando com os bons momentos da trama, acabará rindo de algumas cenas, e até se emocionando com alguns pontos fortes, mas principalmente o grande resultado final fica a cargo de mostrar que com muita persistência, mesmo com diversos obstáculos no caminho, você pode alcançar o ápice dos seus sonhos, e assim sendo o longa vale a pena ser conferido mesmo com muitos erros pontuais. Bem é isso pessoal, ainda falta mais um filme para conferir nessa semana, afinal as distribuidoras deixaram de lado muitos outros que poderiam estrear por aqui, então volto em breve com mais um texto. Então abraços e até logo mais.

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