Sempre vou acreditar que podemos ter um cinema brasileiro estiloso e diferenciado, sem a necessidade de fugir do comercial, mas ultimamente ou vemos algo completamente artístico, ou algo que vai atingir a grande massa! Dito isso, tenho de falar que facilmente "Não Devore Meu Coração" embora seja uma produção linda no conceito estético, possua excelentes atuações (inclusive com Cauã Reymond surpreendendo! - o que é raro!) e contenha uma história bem elaborada, não irá conseguir segurar o público normal de cinema, tanto que o casal que estava mais para trás na sessão ameaçou ir embora umas três vezes, desistindo e resolvendo ver até o fim para ver que rumo tomaria a história, e com um ritmo bem desenvolvido e cadenciado, por pouco a trama de 106 minutos não vira uma novela imensa de muitas horas, claro que felizmente com um formato bem longe do novelesco, que agrada demais quem for procurando uma boa obra artística para conferir. Ou seja, como costumo dizer é um filme para poucos, e que vai funcionar muito para esses poucos, pois contém tudo o que devemos ver num bom longa de classe e ainda envolver com uma história criativa (embora tenha essência de vários clássicos da literatura!) e bem trabalhada.
A história nos mostra que Joca, um jovem de treze anos, descobre o amor quando conhece Basano, uma menina paraguaia. No entanto, para conquistá-la, Joca passará por grandes dificuldades relativas a problemas na fronteira entre o Brasil e o Paraguai e seu irmão Fernando, que pertence a uma perigosa gangue de motociclistas.
Sei que é mais fácil fazer um longa capitular, pois ao mesmo tempo que você "explica" para o espectador o que deseja que ele veja naqueles momentos, você acaba trabalhando todo o conceito do ato fechado, quase que deixando a história de forma independente, porém esse é um modo muito fraco se você não souber trabalhar bem a trama ao redor, além de cansar com uma forma não linear, ou então, mais criativa de apresentar cada momento, transformando a trama em um livro que possa ser foleado e que quem desejar pular algo fique a vontade. Ou seja, a grande sacada que o diretor e roteirista Felipe Bragança acabou usando em demasia não tornou seu filme um ato emblemático como já vimos em outros longas capitulares (apenas para citar, quem faz isso maravilhosamente bem é Tarantino), mas sim acabou criando um livro visual que podemos não gostar de algo e esquecer aquele momento desconexo, quase podendo pular uns dois ou três capítulos funcionando o resultado final como foi entregue. Não digo de forma alguma que ele tenha falho no conceito que quis passar, mas poderia facilmente entregar a história todinha sem precisar quebrar a todo momento, apenas criando encaixes melhores. Sendo assim, uma dica para quem for conferir, tente evitar ler os títulos dos capítulos, que talvez a explicação criativa seja melhor do que a escrita.
Dentro do conceito das atuações temos de ser sinceros ao dizer que escolheram bem Cauã Reymond para dar vida ao personagem Fernando, pois ao mesmo tempo que trabalha o ar bad boy que ele costumeiramente faz, ele conseguiu expressar fortes traços serenos de quase um pai nas conversas com o jovem Joca, mas como destaque temos de citar suas cenas junto de Telecath, e principalmente na cena com a mãe aonde mostrou ser impactante sem destoar da cena. O estreante Eduardo Macedo foi determinante nas cenas de seu Joca, criando tanto uma boa dinâmica, quanto um carisma gigante para que conectássemos ao seu personagem mesmo que por diversas vezes seu amor platônico pela garota seja algo difícil de encarar, mas como bem sabemos o primeiro amor é algo que marca, e aqui o jovem fez isso muito bem. E se teve alguém que conseguiu um destaque expressivo foi a também estreante Adeli Benitez que fez com sua Basano, sem perder a compostura artística em momento algum, tendo um ar interpretativo que poucas vezes conseguimos ver alguém tão nova fazendo, e assim sendo teremos de observar sua carreira, pois pode despontar forte em outros longas. Dentre os demais que saem um pouco do trio principal temos Marco Lori tentando chamar a atenção com um expressivo Telecath, mas também soando como alguém de presságios e características místicas que chamam bem a atenção, e pelo outro lado mais negativo tivemos uma participação meio que jogada do pai dos garotos interpretado por Leopoldo Pacheco. Temos algumas rápidas participações de Ney Matogrosso como um Mago, que deram uma pegada mais mística para a trama, mas nada que mostrasse uma grande expressividade do cantor.
Se vai fazer um filme artístico, o mínimo que se espera é um conceito visual de primeira linha, aonde a estética fale por si e agrade demais nesse conceito, e aqui o longa fez tudo isso com muito louvou, ao escolher ótimas locações que criaram símbolos com muita cenografia de precisão e que junto de ótimas escolhas de ângulos, acabou transformando uma trama singela em algo bem mais ousado e trabalhado. Além disso, aparentemente usaram vaga-lumes reais para compor uma cena (criando algo lindo de se ver), colocaram muitas motos para realçar as cenas das gangues, e principalmente casas simples jogadas no meio do nada para mostrar o clima de guerra na fronteira sem forçar a barra, nem deixar abstrato demais. Com uma fotografia mais densa, a trama conseguiu ousar em determinados pontos para auxiliar na tensão, no romantismo poético, e até mesmo criar uma ambientação misteriosa e mística, mas o principal ponto foi o design perfeito que optaram por seguir para que tudo ficasse simbólico e incrível.
Enfim, é um filme poético e bem trabalhado, cheio de nuances, mas que falhou principalmente no modelo capitular demasiado explicativo e em alguns momentos enrolados demais que acabaram alongando demais a trama, mas nada que atrapalhasse o resultado final. Claro que é um filme que o público comercial não irá curtir, pois sai do elo tradicional e do ritmo agradável para se acompanhar uma trama, mas quem gostar de longas de festivais, artísticos e mais cheios de mensagens, certamente irá gostar bastante do que verá. Portanto fica a recomendação de mais um longa nacional de boa qualidade, que vai surpreender pelo lirismo entregue. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje, mas volto em breve com mais textos, então abraços e até logo mais.
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