Chega ser até difícil formar palavras sobre o quão impactante foi ver o filme "O Motorista de Táxi", pois a trama inicialmente parece meio boba, ao mostrar um motorista bem pobre, alienado que nada está acontecendo no seu país, com uma mentalidade bem pequena e com manias bem estranhas e cômicas, mas com o andamento da história, as fortes cenas de guerra contra o povo na cidade, e até mesmo a maneira que mostra a distorção dos fatos para que a imprensa foque a favor da ditadura e não do povo vai vertendo em algo tão forte, duro e emocionante que a vontade era de aplaudir o diretor de pé caso estivesse na sessão, pois muitos já fizeram filmes impactantes, mas poucos conduziram algo com uma maestria tão bem pontuada, sem abusar de diálogos soltos, sendo preciso no que desejava mostrar e criando uma história de pano de fundo bem colocada, que amarrada aos fatos reais relatados pelo repórter, o resultado acabou ficando mais do que perfeito, quase sendo uma ode contra a ditadura, que todos que torcem por isso precisam assistir, e mesmo quem também é contra precisa ver para conhecer mais ainda o que é esse meio de governo impositivo.
A sinopse nos conta que um taxista de Seul é contratado por um jornalista estrangeiro para levá-lo até a cidade de Gwangju. Ao chegar lá, eles se deparam com o lugar tomado pelo governo militar e com os cidadãos, liderados por um grupo de estudantes, reivindicando liberdade. O que começa com uma simples corrida de táxi se torna uma luta pela sobrevivência em meio à Revolta de Gwangju, evento real que aconteceu na Coreia do Sul em maio de 1980.
Não vou falar que já vi qualquer um dos filmes do diretor Hun Jang, pois certamente estaria mentindo, mas vendo os temas e pôsters consigo observar o quão fácil foi trabalhar a criatividade de guerra desse novo filme, pois já trabalhou muito com o tema de enfrentamento, apenas teve de verter ele para as manifestações públicas ao invés de lutas de soldados, e com isso, o que ele fez foi algo tão bem encaixado, que não vemos nenhum subjetivismo incorporado, apenas a forma mais crua de fazer arte e trabalhar bem a opinião pessoal sobre um tema, colocando fatos reais juntos de uma história contada, que como é dito no final, ele nunca mais encontrou o taxista, então não temos uma outra versão dos fatos, mas de certo modo a forma trabalhada foi desenvolvida da melhor forma possível, conseguindo divertir em muitas cenas, fazer com que ficássemos bravos em outras, e claro emocionando na maioria das situações, criando uma trama de diversos sentidos, que funciona bem e resume de forma incrível cada ato que já foi visto em manifestações mundo afora, que por muitas vezes foram até "amenizadas" pela imprensa em favor dos políticos do país.
Sobre as interpretações, temos de falar basicamente dos dois protagonistas, mas tenho que pontuar sem dúvida alguma as boas expressões carismáticas de todos, procurando sempre ajudar e sendo determinantes nos seus momentos para que o filme funcionasse como um todo. Dito isso, é fato que a escolha de Kang-ho Song para o papel de Kim foi algo bem posicionado e incrível ao mesmo tempo, pois seus trejeitos, postura e tudo mais caíram como uma luva bem encaixada para com o personagem, trabalhando inicialmente como uma pessoa positivista, acreditando que o país é o melhor lugar do mundo, indo contra as notícias, mas ao ver a realidade, o ator incorporou uma faceta tão expressiva, que vamos junto com ele no desespero de sair dali, mas também salvar seus co-irmãos, ou seja, perfeito para o papel. Thomas Kretschmann é bem conhecido por fazer grandes produções de ação, mas aqui ele praticamente falou bem pouco com a voz, afinal um alemão falando inglês no meio da Coreia com todos falando em outra língua não seria tão interessante, mas ao menos deu um bom tom divertido no começo, mas ele não precisou de sua voz para mostrar o grande feitio, mas sim com olhares aflitivos de repórter que quer mais, mas já não sabe como, sua grande cena é a do hospital quando já desacreditado é entusiasmado a voltar a filmar, e com uma grande ânsia conseguiu mostrar como sobreviveu graças ao taxista e mesmo que o real Peter tenha morrido no ano passado, ele certamente um dia irá encontrar seu amigo Kim.
Com toda certeza a equipe de arte deve estar procurando o diretor para receber um cachê dobrado, pois foram chamados para um drama envolvendo um táxi, e acabaram no meio de um filme de guerra, com armas, soldados, muitos tiros, figurinos e maquiagens destroçadas, cidade em caos e tudo mais que você possa imaginar, ou seja, um trabalho imenso de grandiosidade de produção de nível altíssimo, mas visto como um filme de arte singelo, que acabou acertando nos detalhes e valeu cada centavo investido na produção para marcar em todo lugar como um filme que precisa ser visto, ou seja, um trabalho perfeito da arte. A fotografia encontrou ângulos precisos para relatar tudo, trabalhou cada nuance no meio da fumaça e do caos, encontrou tons e cores para realçar cada momento, ousou em sombras e luzes, fazendo com que o filme tivesse uma densidade tão precisa que volto a frisar, lembrarei muito desse longa.
Enfim, um filme que me tocou demais, que fui ver desacreditado que seria tão bom quando vi o trailer, mas que vale demais por tudo o que passa, fechando com certeza a Mostra Internacional (ou ao menos os 10 filmes que vieram para cá) como o melhor de todos, e que certamente irei recomendar para todos que me perguntarem um filme sobre a real vértice da ditadura em um país. Portanto quem puder veja o longa, teoricamente ele estreia comercialmente no Brasil no dia 11 de Janeiro, e vamos torcer para que muitos que desejam esse tipo de governo veja e pense melhor. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje encerrando a Mostra, mas amanhã já irei conferir uma das duas últimas estreias que ficaram faltando dessa semana, então abraços e até breve.
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