Já é quase uma tradição praticamente todo ano termos um filme de Woody Allen, e 2017 já estava quase acabando sem termos um para conferir, mas eis que aparece "Roda Gigante" para nos deliciarmos no seu estilo peculiar de trabalhar personagens diferentes, geralmente com muitas crises para resolver, e que junto de uma cadência quase que orquestrada consegue ir entregando aos poucos as situações deixando que elas não se choquem, mas se complemente piorando ainda mais as crises entregues no começo. Ou seja, o tradicional que vemos quase sempre em seus filmes, mas que aqui usando a analogia de uma roda gigante mesmo, começa em um ponto, dá algumas voltas, e volta para onde você entrou, e assim muitos vão reclamar do filme ser um pouco confuso, outros sairão sem entender nada, mas o que Woody quis passar basicamente, ao menos na minha concepção, foi que o ciclo de algo que está ruim é continuar ruim, mesmo que você tenha alguns momentos bons, dificilmente você irá sair disso se iludindo.
O longa nos situa em Nova York, anos 50. Ginny vive um casamento insosso com um operador de carrossel, que trabalha no parque de diversões de Coney Island. Passeando pelo local, Ginny conhece o guarda-vidas bonitão Mickey e cai de amores por ele. Mas a enteada dela também está apaixonada por Mickey, gerando uma série de confusões nesse triângulo amoroso.
A história que Woody criou e dirigiu, lembra muitos de seus filmes, porém trabalhou uma estética diferenciada e com uma síntese mais próxima de querer trabalhar o ciúmes e as crises da vida que algumas pessoas acabam tendo, com isso claro enfatizando o ar feminino em destaque. E como é de seu costume, o diretor usou um narrador que fala para a câmera, que em muitos filmes ele mesmo atuou nesse papel, e ultimamente tem tentado acertar "musos" que inspire seu estilo e acabe mostrando algo a mais para a trama, e aqui o jovem salva-vidas tem uma essência bem interessante em querer saber mais das histórias trágicas das vidas das mulheres, não se importando tanto com elas, de maneira que tudo acaba soando até bizarro por vezes, e claro que como ambas as damas são bem bonitas, acaba ficando óbvio que seu interesse além de histórias recai sobre outras coisas também. Ou seja, o tradicional filme "romântico" dramatizado por Allen, que vai nos entregar um pouco de tudo, da vida tradicional dos protagonistas, mas claro, sem entregar realmente sua essência, deixando que isso seja feito com o tempo.
Assim como fez com Cate Blanchett em "Blue Jasmine", que a atriz acabou explodindo em forma expressiva, aqui Woody começou com Kate Winslet singela, meio insossa, desanimada com a vida de sua Ginny, mas vai incorporando num crescente tão forte da personagem em meio ao ciúmes e claro do novo amor, que nas penúltimas cenas já a vemos toda enfeitada, pronta para o sucesso, encarando tudo de forma completamente diferente, ou seja, um arraso de atriz, que ficou um tempo meio apagada (assim como sua personagem), mas que vem voltando com a corda toda, principalmente mostrando que tem dormido no formol e está ainda mais bela a cada ano que passa. Justin Timberlake conseguiu imprimir um de seus melhores personagens aqui com seu Mickey, claro que está longe de ser perfeito, mas trabalhou sem muitas firulas usuais, e acabou soando mais como um aproveitador no meio de conseguir como poeta buscar suas histórias no meio de seus trabalhos, e com isso e claro muitos galanteios, o ator ficou bem trabalhado, só temos de pontuar um detalhe, ele embora tenha cara de novinho, já não é mais tão novo para o papel. James Belushi apareceu pouco com seu Humpty, e com isso não pode mostrar tudo o que poderia, pois se nos poucos momentos seus já deu nuances fortes, colocou carisma na relação com a filha, deu o tradicional conflito com enteado, foi pescar, fez festa com os amigos, e foi em busca de respostas, imagina se o longa fosse focado nele, o ator destruiria em cena. June Temple fez caras tristes e desesperadas no começo de sua Carolina, e foi sutil nos momentos que precisava incorporar mais, mas funcionou bem e encaixou boas cenas, trabalhando uma química interessante nos conflitos com a protagonista, e claro no jogo de sedução com os homens da trama. Fora do eixo dos protagonistas, tivemos também algumas cenas tensas com o mini-psicopata incendiário interpretado pelo jovem Jack Gore, e embora sua história não desenvolva muito, o garoto fez boas caras e claro mostrou que não brinque com quem gosta de ir no cinema todo dia.
Dentro do conceito visual, esse pode ser considerado o mais diferente dos filmes do diretor, que sempre presaram cenas simples, com locações simples, e aqui tivemos um belo trabalho de composição de época, com muitos objetos cênicos característicos, e claro também com muito trabalho de computação gráfica para recriar a Coney Island dos anos 50, pois como bem sabemos hoje é bem diferente da época, as praias com muitos figurantes vestindo figurinos da época deu um charme a mais para o calçadão e com isso o resultado visual acabou ficando incrivelmente bem trabalhado. E junte ao bom trabalho da equipe de arte, o excelente trabalho do diretor de fotografia Vittorio Storaro que praticamente fez mágica com as cores de sua iluminação, trabalhando os sentimentos dos personagens com as luzes, criando tons fortes e bem vivos para realçar o calor do verão e da paixão, incorporou tons frios e escuros nos momentos de chuva e de raiva dos personagens e com isso, aliado aos bons enquadramentos cênicos, tivemos um dos filmes mais bonitos visualmente que já vimos de Woody Allen.
Enfim, é um filme difícil, que nem todos vão se apaixonar por ele, e que também não procurou ser feito para que todos gostassem, mas que ao trabalhar bem o conceito estético juntamente com uma boa história dramática com pitadas cômicas, e com interpretações maravilhosamente bem dirigidas, o resultado acaba sendo algo interessante de se ver, e que quem for fã de Woody Allen vai ver que aos 82 anos continua em plena forma, fazendo mais e mais bons filmes. Sendo assim, recomendo a trama para quem gosta do estilo romance dramático, pois os demais vão achar muita bagunça para pouco resultado. Bem é isso pessoal, encerro aqui as estreias da semana, mas amanhã já confiro a última pré-estreia do ano e volto também com a retrospectiva de 2017, então abraços e até logo mais.
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