É interessante quando vemos uma produção da Argentina em parceria com o Brasil, que vemos as características de nossas novelas, mas envolvendo temáticas duras que são trabalhadas nos filmes por lá, e o misto geral acaba ficando ao mesmo tempo forte e com uma pegada que fica faltando algo em "Uma Espécie de Família". Não digo que foi um longa perfeito, nem que tenha ficado ruim, apenas ficou faltando algo mais crível para a situação toda, pois uma mulher que deseja ser mãe acabaria fazendo tudo de uma forma bem diferente, e dificilmente faria as mesmas situações de desespero ou a falta dele como a protagonista acabou fazendo. Agora tirando esse desvio, outro detalhe que o filme pontua com força é a famosa venda de adoções que existem em milhares de países, e que quem deseja adotar tem de ficar com o máximo de cuidado até o fim do processo, ou seja, a trama também funciona como um alerta além de ficção.
A sinopse nos conta até mais do que o próprio filme, dizendo que Malena é uma médica de classe média em Buenos Aires. Certa tarde ela recebe uma ligação do Dr. Costas dizendo que ela deve ir imediatamente para o norte do país, pois o bebê que ela estava esperando está prestes a nascer. De repente e sem pensar, Malena decide partir em uma viagem incerta, cheia de encruzilhadas, nas quais ela precisa lidar com obstáculos legais e morais. Ela se pergunta constantemente até que ponto está preparada para conseguir o que mais quer.
Embora tenha usado de muito impacto em sua trama, o diretor Diego Lerman acabou indo por vértices novelescos demais para com seu filme, de modo que se a pessoa já está sofrendo, ou com azar, tem de ir piorando da forma mais deplorável possível, e com isso a trama não se desenrola. Porém longe disso ser ruim aqui, a forma acaba funcionando para prender a atenção do público e para que entrássemos dentro dos sentimentos da protagonista, ou seja, para que fosse inserido algo mais visceral e além de alerta o filme funcionasse dentro de um carisma próprio. Ou seja, temos um filme com funcionalidade, mas que poderia ser visto de inúmeras outras maneiras, e com certeza escolheram a menos correta que é o formato mais próximo de um capítulo de novela. Claro que isso não é errado, mas a trama subverte e depende demais da protagonista e seus surtos, ao invés de recair sobre a história, mas ao menos no final toda essa dureza acaba de uma maneira forte e coesa para a ideia do diretor, que com muita certeza é diferente da do público (ao menos ele não deixou a história aberta como muitos fariam, e deu sua opinião).
Dentro das interpretações, diria que Bárbara Lennie foi bem ampla em sua atuação, incorporando diversos sentimentos e aflorando praticamente todos nos momentos exatos que o longa necessitava com sua Malena, mas claro que certamente faltou ainda aquele detalhe dinâmico para que seus atos ficassem marcados em nossa mente, de modo que sempre soou simples para com suas atitudes. Daniel Araóz entregou um Dr. Costas bem típico de médico de quadrilha, que faz tudo parecer bonzinho, mas que no fundo está envolvido em muitos esquemas, assim como todos do hospital, fazendo caras e bocas mas nada que impressionasse pelas expressões, mas sim pelo conteúdo de suas atitudes. Yanina Ávila trabalhou pouco com sua Marcela, mas mostrou o desespero tradicional de mulheres que sofrem as atitudes de ter que "vender" seus filhos para poder criar os demais, caindo sempre no golpe das quadrilhas, e seu grande momento claro foi na saída do hospital tão mais impactante quanto a sua cena final. Claro que como líder da quadrilha tínhamos de ter uma atriz brasileira, e isso ficou a cargo de Paula Cohen, com olhares de boa moça para informar, mas totalmente expressiva na hora de contar o dinheiro, ou seja, a loba vestida de cordeiro.
Visualmente o longa escolheu locações bem pobres para expressar a ambientação de lugares criminosos, como um hospital no meio do nada, praticamente abandonado e funcionando apenas em prol da quadrilha, e que desde a primeira cena expressa uma certa estranheza que não sabemos o que é mas que mais para o fim descobrimos, casebres jogados em regiões quase desérticas, e claro famílias pobres que dependem dessa "ajuda" para sobreviver. Junto disso coloque símbolos como a nuvem de gafanhotos, a má sorte da protagonista na lama com seu carro, e muitas outras coisas que foram colocadas como referências e arquétipos para que a trama tivesse um tom mais fantasioso, ou seja, um trabalho da arte feito com minúcias, mas que pouco refletiram na melhoria da história.
Enfim, é um filme interessante, mas que não ousou como poderia e acabou entregando algo mais simplista e simbólico do que realista, claro tendo as devidas doses de informação e alerta, além claro de fazer com que o público refletisse quais atitudes teriam em cada momento (e revelo a minha, que se fosse a protagonista, pegaria a criança no hospital mesmo e dava adeus correndo!). Ou seja, não é um filme que vai agradar muita gente, mas que vai moldar bem as ideias de quem for conferir, sendo assim recomendo ele com ressalvas. Bem é isso pessoal, fico por aqui agora, mas volto em breve com a crítica do último filme da Mostra, então abraços e até logo mais.
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