Colette

1/12/2019 01:59:00 AM |

Sempre é bem interessante vermos o quão complicado era antigamente (algumas coisas ainda se mantém atualmente, mas em números e impactos menores) para as mulheres viverem e trabalharem com o que gostavam, afinal se hoje o machismo ainda impera em diversos meios, no começo do século 20 era praticamente imposto tudo em cima delas, de modo que aqui em "Colette", vemos a jovem sofrer poucas e boas com o marido mulherengo, que exigia que ela escrevesse suas histórias, mas que as lançava em seu nome, ou seja, algo muito comum naquela época, mas que foi muito bem superado pela escritora, que depois virou dançarina, mas que ainda lançou muitos romances na França, mostrando empoderamento e muita perspectiva de impacto através de boas interpretações, uma concepção de época completamente funcional, e diálogos bem encaixados dentro da trama, só tendo um único adendo na opinião desse que vos escreve, a falta do longa ser francês, afinal vemos a protagonista escrevendo em francês, porém falando e pensando em inglês, o que não é algo muito bacana quando se está falando de uma personagem francesa. Mas tirando esse leve detalhe, a trama consegue prender, ser leve no desenvolvimento, mas completamente impactante para trazer muitas alegrias para todos que forem conferir nos cinemas, e sendo assim, é um filme que vale a conferida.

O longa nos situa na França, no início do século 20. Casada com o escritor Henri Gauthier-Vilars, o “Willy”, Sidonie-Gabrielle Colette sai sua casa na França rural para o esplendor intelectual e artístico de Paris, onde Willy a convence a escrever como o seu “ghost writer”. Ao criar a fictícia adolescente rural Claudine, obtém o sucesso e também o escândalo pelas referências sexuais da personagem. A sua luta pela propriedade intelectual de suas obras, vestir-se com roupas masculinas e assumir a defesa às questões de gênero levam-na a enfrentar a justiça e superar as restrições sociais, revolucionando a literatura, a moda, a repressão sexual e o direito da mulher sobre o seu corpo.

O diretor inglês Wash Westmoreland soube entregar para seu longa uma força bem trabalhada na protagonista, montando a época ao redor dela, e não o inverso que costumamos ver, de uma personagem vivendo em determinada época, e assim sendo passamos a conhecer os momentos de Paris através dos atos de Colette, com os deslanches literários, as peças de teatro com muitas mímicas, o início do cinema, o Moulin Rouge valorizando a arte de múltiplos gêneros e tudo mais, de modo que o filme se formos analisar além da personagem até conseguimos observar diversos momentos em si, mas além disso, vemos a força da protagonista para ir além do que uma casual dona de casa faria na época, escrevendo, sendo ativa nas festas, e principalmente se encontrando como homossexual e/ou bissexual, de maneira que caso o diretor desejasse em seu texto, em cima da história criada por Richard Glatzer, ele poderia ter causado muito mais, impactado os atos com situações mais fortes, mas não, ele optou por algo mais sutil e bem moldado com um carisma bem impregnado em cima da protagonista, e se desenvolvendo pelas beiradas, o que acaba sendo bem interessante de acompanhar, mas ainda assim poderia sim ter forçado mais alguns momentos, e limpado outros da trama, que aí sim teríamos um envolvimento maior.

Dentre as atuações, o longa até possui muitos personagens, alguns com bons diálogos, porém o destaque fica bem centralizado nos dois protagonistas, e a rainha dos filmes de época Keira Knightley conseguiu dar uma boa personificação para sua Colette, trabalhando olhares, postura, e claro muita classe nos trejeitos para que a personagem ficasse como alguém imponente para a sociedade da época, e conseguisse ter uma vivência bem colocada, ou seja, a atriz de um show, só faltando talvez incorporar alguns momentos de uma forma mais forte, pois foi sutil demais na maior parte do longa. Dominic West também foi bem coeso na forma que entregou seu Willy, encontrando ares bem cafajestes, olhares vagos, e muita imponência de comando, o que deu um ar forte para seu personagem sem precisar erguer a voz ou gritar em momento algum, o que é raro de ver na maioria dos atores. Dentre os demais, ou melhor as demais, os destaques ficaram para as cenas sensuais envolvendo o triângulo amoroso de Eleanor Tomlinson com sua Georgie, Denise Gough com sua Missy forte e interessante pelo ar masculino que impôs para sua personagem, e Aysha Hart com sua Polaire, mas mais pela sua personificação de Claudine.

Falar de direção de arte em longa de época é quase que ser repetitivo de elogios, pois é algo que ou se acerta a mão e faz algo maravilhoso, ou erra em tudo e é melhor nem lançar o longa, e claro que aqui como o filme foi bem lançado, vemos detalhes de figurinos clássicos do começo do século 20, vemos teatros famosos, casas de campo envolventes, e claro as festas da literatura cheia de pessoas da alta classe flertando uns com os outros, tudo com ares grandiosos, mas de maneira bem fechada pelo diretor para que não necessitasse criar muitos ambientes imensos, conseguindo trabalhar de maneira mais simples e efetiva, com ângulos curtos, aonde os detalhes pudessem ser bem valorizados, e isso foi um bom acerto para o longa. A fotografia da trama não quis ousar muito, e trabalhou muito com tons escuros, algo que não é muito comum em longas de época, mas acredito que tenha sido para dar um tom mais dramático do que romanceado que o longa poderia se tornar se brincasse mais com tons pasteis e/ou claros, ou seja, um filme quase todo jogado para o preto, o que não foi errado e nem ruim de ver.

Enfim, é um longa que conseguiu ser bem feito, entregar a proposta com força sem precisar de apelações grosseiras, e principalmente mostrou a época de uma forma diferente da usual, só pecando realmente na falta do idioma francês como disse no início, pois certamente teríamos um charme a mais, e uma coerência bem mais colocada, mas como longa que emprega bem o empoderamento feminino desde muito tempo atrás, o resultado surpreende e faz com que todas as garotas da sessão saiam bem felizes com tudo o que viram na telona, ou seja, é daqueles que vale muito a pena recomendar, e fica a dica para quem estiver nas cidades que possuem o projeto Cinema de Arte conferirem, pois o longa é o destaque do momento. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje, mas volto em breve com mais estreias, então abraços e até logo mais.

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