Alguns filmes trabalham mais a sensibilidade do que outros, mostrando que muitas vezes algo que acabamos fazendo contra alguém pode não ser muito bom, e quem sabe esse alguém ainda pode nos ajudar mais para frente. Em "Inspire, Expire", temos uma situação moldada para emocionar, com uma tensão dramática bem casual que pode ocorrer com qualquer um, temos uma direção bem equilibrada que consegue segurar cada ato na medida correta (o que fez o diretor levar o prêmio no Festival de Sundance), mas que talvez pudesse ter algum ato mais impactante para fazer o público desabar, pois a resolução final fica muito marcada no momento em que vemos na tela bem no miolo da trama, e mesmo tendo uma síntese momentânea forte que parecia ser algo diferenciado, a volta fez com que ficássemos um pouco desapontados. Porém ainda assim, é um longa forte, bem coeso, e que mostra que a Islândia também sabe dosar uma trama mais forte sem precisar trabalhar o frio e a pesca como temas (e olha!!! responderam minha pergunta feita em 2016: se existia alguma cidade mais movimentada na Islândia, e aqui temos algo um pouco mais dinâmico que os famosos "Heartstone" e "Ovelha Negra").
A trama nos mostra que na península da Islândia, as vidas de duas mulheres irão se cruzar por um breve momento. Presas em circunstâncias imprevistas, uma mãe islandesa e uma candidata de um asilo da Guiné-Bissau formam um vínculo delicado enquanto tentam colocar suas vidas de volta no caminho certo.
A diretora e roteirista Isold Uggadottir em seu primeiro longa optou por não ousar muito, trabalhar a densidade dramática e usar a simplicidade emotiva nas personalidades de seus personagens brilhantemente interpretados por três ótimos atores e um gato, de modo que cada ato parecesse até maior do que realmente é, pois embora o filme tenha 95 minutos, ele parece ser maior, e o melhor, sem cansar em nada, pois vamos entrando dentro da mente de cada personagem pensando como poderia resolver isso? O que é melhor pra ela? E com isso, ela não larga as pontas abertas, e dá a sua opinião (talvez a mais fácil de todas, mas que exigiu um certo trabalho também), e conseguiu ser simples e efetivo, tanto que o Festival de Sundance que gosta desse estilo acabou lhe premiando como melhor diretora de 2018, mas que certamente talvez um pouco mais de ousadia cairia bem na dinâmica, e envolveria muito mais.
Sobre as atuações é fato que o trio foi perfeitamente escolhido pela sintonia dos olhares, que acabam entregando não só tristeza, mas também desespero em diversos momentos, preocupação com tudo, e claro também outros sentimentos mais a fundo se procurarmos mais ao final da produção, e dessa forma felizmente eles conduziram a trama ao resultado preciso que a diretora necessitava. Kristín Þóra Haraldsdóttir nos entregou uma Lára dura e muito apreensiva, de modo que mesmo sem mostrar seu passado, vemos que foi algo bem sofrido, cheio de conflitos e confusões, que qualquer ato que ela vá fazer terá de ser pensado mais do que uma vez, e essa apreensão que ela consegue nos transmitir é sentida a cada momento, ou seja, por uma fagulha a personagem poderia explodir, e talvez tenha sido isso o que faltou para o filme ficar mais forte ainda. Babetida Sadjo colocou para sua Adja uma sinceridade no olhar que é impossível que o espectador não sinta pena e queira ajudar a personagem, de modo que tudo o que faz mesmo que viesse a ser a maior loucura do mundo, estaríamos apoiando, e torcendo para que ela conseguisse chegar no Canadá junto de sua filha, ou seja, um show realmente de interpretação. O jovem Patrik Nökkvi Pétursson também entregou um Eldar bem colocado e cheio de momentos carismáticos, de modo que talvez um conflito com ele impressionasse e marcasse ainda mais o filme, mas sem essa necessidade, o garoto soube dosar suas cenas de uma forma primorosa e agradou junto com seu gatinho Músi.
Assim como a maioria dos longas da Islândia, vemos um clima que ajuda a dar tensão, com ventos, chuva, frio e tudo mais fazendo parte da cenografia com muita força, de modo que chega a ser até bonitinho ouvir do garoto seu sonho de ir para um país e usar uma bermuda o dia inteiro, além disso, tanto o aeroporto foi bem planejado para que as cenas não necessitassem ser gravadas dentro de um aeroporto real (ficando bem trabalhado), as cenas no abrigo para os deportados/recusados também tiveram uma boa densidade cênica, mas certamente as cenas no carro são as mais fortes por todo o contexto quase de road-movie, mas sem sair do lugar, ou seja, uma precisão cênica incrível, que só não é mais forte que os momentos finais no porto, que ali a tensão chegou a ser bem alta, e certamente poderiam ter valorizado ainda mais o tempo lá, o que não ocorreu. A fotografia do longa ficou praticamente toda em tons bem acinzentados e azulados para dar uma dramaticidade maior ainda para o filme, que junto do clima acabou ficando muito bacana de ver, e ajudou muito no ritmo do longa.
Enfim, é um filme bem forte, que agrada bastante quem gosta de longas dramáticos intensos, mas que certamente pecou por não ir mais forte ainda, pois o longa tinha essa possibilidade, e necessitava disso para derrubar o público, e ganhar ainda ares maiores nos diversos outros festivais que o longa participou, mas mesmo sem esse impacto, o resultado vale a pena ser conferido, e fica a recomendação para todos que gostarem do estilo verem na Netflix. Bem, eu fico por aqui hoje, mas volto em breve com mais textos, então abraços e até logo mais.
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