Quando belos dramas reais acabam virando filme, geralmente eles conseguem nos emocionar em determinados momentos de virada, pois a sacada acaba funcionando para comover, e como passamos boa parte do longa envolvidos com tudo o que vem ocorrendo, o resultado permeia nosso cérebro para sentirmos a emoção junto com os protagonistas. E claro, que isso ocorre no ápice de "O Garoto Que Descobriu o Vento", e que o pôster revela mais spoilers que qualquer fanático chato de longas de filmes de super-heróis. E com essa essência, a trama em si é bem forte, consegue prender a atenção, só que possui um problema tão forte que raspou a trave de transformar o longa numa tortura cansativa sem limites: ser a primeira direção de um ator famoso, que até tentou ser ousado em alguns momentos, mas que tentou trabalhar tantos vértices na história, que por bem pouco quase não conseguiu mostrar nenhum direito. Ou seja, é um bom filme, mas que não flui como deveria, e cansa bastante no miolo, para trabalhar política, cultura e tudo mais, voltando mais ao final para o que realmente importava, e assim emocionar e funcionar.
A sinopse nos conta que sempre esforçando-se para adquirir conhecimentos cada vez mais diversificados, um jovem de Malawi se cansa de assistir todos os colegas de seu vilarejo passando por dificuldades e começa a desenvolver uma inovadora turbina de vento.
O longa tentou mostrar que com estudos, e pensamento fora da caixa, se pode ir muito além do que sua família, sua vila, ou até mesmo os seus costumes trariam para você, e com essa dinâmica encrustrada no roteiro de Chiwetel Ejiofor, que é baseado no livro de William Kamkwamba, o diretor e roteirista até tentou colocar força nos atos, mostrar processos políticos difíceis que acontecem aos montes na Africa, e primorosamente mostrou que a fome sempre mata por onde passa, causando guerras, brigas, e tudo mais, mas aí é que entrou a falha de Chiwetel, que se você reler esse meu parágrafo verá que falei praticamente nada dos ensinamentos mostrados nas escolas do país, das desenvolturas da irmã que sempre desejou cursar a faculdade e era mal-vista pela família por desejar isso, e por aí vai, pois ele quis mostrar coisas demais, e desfocou um pouco a atitude do garoto em tentar estudar mesmo sem que os pais pagassem seus estudos, indo escondido para a escola, mexendo seus pauzinhos para ser criativo e inventivo, ou seja, só com o garoto e suas desenvolturas, o diretor poderia ter ido bem longe, e feito um filme incrível, mas quando se quer demais, o resultado sai de menos, e assim, embora o filme seja bem tocante no final, o miolo acaba forçado demais para retratar tudo o que desejavam.
Quanto das atuações, posso afirmar facilmente que todos se dedicaram bem aos seus papeis, e que o jovem Maxwell Simba foi muito doce e cheio de vivências para seu papel de protagonista como William, de modo que mesmo não sendo experiente, soube jogar as atitudes para cima de cada ato, e com simplicidade nos trejeitos, ele conseguiu chamar a atenção sendo sutil e bem atento em cada momento. Chiwetel é um tremendo ator, isso já foi mostrado em tantos filmes, que nem precisaria se colocar como protagonista aqui, e claro que seu Trywell foi dinâmico, emocionou pela forma rudimentar de encarar as diversas situações, e chamou para si a responsabilidade cênica em diversos momentos, mas como é coadjuvante nas cenas com o garotinho, ele como todo bom diretor, deixou que a câmera não lhe valorizasse tanto, mas ainda assim agradou bastante. Quanto dos demais personagens, diria que necessito falar mais das mulheres do que dos homens, pois esses foram coesos nas atitudes, trabalharam bem encaixados, mas nada que se destacasse, enquanto Aïssa Maïga emocionou nas cenas fortes de sua Agnes, Noma Dumezweni entregou a bibliotecária com muita doçura e envolvimento, e até mesmo Lili Banda ficando em segundo plano com sua Annie foi forte de trejeitos para que suas cenas ficassem densas, ou seja, todas caso fossem melhor usadas na trama, chamariam o longa para si, e detonariam.
A equipe artística foi bem forte em mostrar tanto a seca que castiga com muita força o país, quanto também que o desmatamento anda causando um dos problemas mais horríveis que são os alagamentos de diversas cidades/vilas, de modo que nada sobrevive 100% funcional, além disso, souberam mostrar muitas situações bem moldadas, como guerras e assaltos, escolas com quase nenhuma estrutura para aprenderem, casas simples, lavouras simples, e claro o governo truculento que tenta ocultar ao máximo suas opiniões com situações estranhas. E dessa forma, desenvolveram um longa bem denso, escolhido com minúcias nas locações do país para que o filme tivesse um encaixe bem moldado, e quando entraram nas questões místicas, colocaram algo do estilo de uma folia de reis, bem cheia de detalhes, que até valeria ter sido melhor mostrada, mas que ainda assim agrada. A fotografia foi árida num nível fabuloso, com tons secos, amarelados, e que mesmo nas cenas cheias de chuva, o barro acaba moldando tudo para o tom marrom, e assim, a dramaticidade fica seca de vértices também, o que funciona para a proposta do longa, mas ajuda a cansar também o espectador.
Enfim, o resultado final pode até ser tocante, emocionar o público e soar cheio de efetivos e merecedores aplausos, mas poderiam ter trabalhado muito mais o miolo para que o filme inteiro fosse condizente com a trama, não deixando tudo para o fim, e dessa forma o cansaço no miolo quase nos faz desistir de continuar, o que não é bom de acontecer num longa de streaming, pois o controle está muito perto de fazer com que o público escolha outro longa, mas ainda assim, afirmo que é pelo resultado completo válido de conferir. Volto a frisar o que Cuarón falou nos seus discursos de diversas premiações, que o streaming e o cinema precisam caminhar juntos, pois assim como aconteceu com "Roma", que tem muitas qualidades, e ainda assim dificilmente passou em pouquíssimos cinemas, no caso desse aqui, seria com certeza impossível de ser visto em uma sala com no máximo 3 pessoas. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje, mas volto em breve com mais textos, então abraços e até logo mais.
2 comentários:
Achei bom esse filme, porem é a mesma coisa que vc falou, o melhor fica no final.
Uma pena né Thiago... o filme podia ser emocionante do começo ao fim que encantaria demais... abraços!!
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