Simplesmente imagine que a bancada religiosa tenha conseguido dominar o Brasil, e colocado todo o restante que é contra as loucuras deles de transformar o país em algo estranhamente conservador (mas ainda tendo algumas pitadas quentes) aonde temos drive-thru de orações com um pastor pronto para pregar diretamente no carro, o carnaval foi apagado e agora temos um estilo de rave gospel como principal evento do país, e principalmente, temos grupos de casas de swing religiosas aonde ninguém trai frente a Deus, mas sim divide o amor após ler alguns versículos, além claro de grandiosas tecnologias para identificar a genética da pessoa através de códigos de barra. Conseguiu imaginar? Isso é mais ou menos o que o longa "Divino Amor" acaba nos entregando durante os seus 101 minutos, tendo até um grande enfrontamento em sua mensagem final pela voz robótica de uma criança que vai nos narrando as situações e pensamentos sobre tudo o que está acontecendo, mas que mais choca o estilo e tudo o que é passado, do que consegue envolver sabiamente as diversas metáforas para ressaltar muitas situações. Ou seja, é daqueles filmes preparados para um público, que talvez até se assuste alguns com as muitas cenas sexuais, mas que a maioria acabará sem entender muito da essência que o diretor quis passar, e com isso o resultado mais choca do que chama para si o interesse, e tirando as grandiosas atuações, e uma produção digamos até interessante pelos efeitos simples mas bem feitos, o restante é uma loucura imensa demais para agradar um público mais comercial.
A sinopse nos conta que Joana trabalha como escrivã em um cartório e, profundamente religiosa e devota à ideia da fidelidade conjugal, sempre tenta demover os casais que volta e meia surgem pedindo o divórcio. Tal situação sempre a deixa à espera de algum reconhecimento, pelos esforços feitos. Entretanto, a situação muda quando ela própria enfrenta uma crise em seu casamento.
Nessa produção entre Brasil, Uruguai, Chile, Dinamarca e Noruega, o diretor e roteirista Gabriel Mascaro conseguiu ser completamente diferente do usual, entregando uma trama até que complexa pela essência, que consegue abstrair muita coisa, passar diversos pontos metafóricos para a mente do público, e que junto de ousadas cenas sexuais conseguiu mostrar seu estilo, porém para que o filme chegasse realmente onde ele desejava dentro do cunho religioso que é mostrado ao final, da saga da mãe de Deus e da volta do Messias, talvez a proposta teria de ter sido ainda mais ousada e não ter brincado tanto com a voz infantil robótica, pois aí sim ele causaria no fechamento com outras vertentes mais elaboradas, mais reflexivas e quem sabe até algumas outras argumentações, e não apenas jogar na narração toda essa desenvoltura. Ou seja, o filme acabou apelando tanto para uma loucura tão abstrata (que infelizmente pode estar acontecendo muito em breve - até menos de 8 anos como é proposto na trama em 2027) que acabaram se perdendo um pouco no resultado final, aonde muitos acabam mais saindo da sessão incomodados com o que viram do que pensando em tudo o que foi proposto na sessão, e isso é muito ruim de acontecer, mas que muitos diretores preferem por ser o caminho mais fácil.
Sobre as atuações, já disse isso em outros filmes, e até mesmo vendo seus programas na TV, e volto a frisar que Dira Paes é uma das grandes atrizes do país, num nível muito fora do comum que vemos casualmente, e aqui sua Joana tem personalidade, tem expressões fortes, e demonstra muita vontade em tudo o que faz em cena, de tal maneira que acabamos sentindo muito com cada ato seu, ficamos envolvidos com suas situações e até torcemos para ela conseguir seu filho, de modo que o resultado do filme seria completamente diferente com outra atriz, ou seja, vale conferir o filme pelo que ela faz nele, e não o inverso como deveria acontecer. Julio Machado é um ator imponente também, e seus papeis costumam florear e pedir mais desenvoltura, porém aqui seu Danilo não consegue chamar tanta atenção, mesmo estando sempre em situações fortes, talvez pela força da protagonista ao seu lado chamar mais atenção, mas ainda assim seus atos são bem feitos. Quanto aos demais, todos têm muito envolvimento com a justiça, com a religiosidade e com os relacionamentos, mas não conseguem passar nada além do seu momento, e isso não é algo bom para uma trama.
Embora o longa tenha um conceito futurista, a grande sacada foi não ir para tão longe, senão teriam de inventar coisas bem mais mirabolantes, então optaram por criar os códigos genéticos em barras, que identificam as pessoas, as grávidas, os fetos registrados já, os pais, tudo bem rápido, mas ainda extremamente burocrático nos cartórios (ou seja, ainda vamos ter muita dor de cabeça para registros no futuro!), o drive-thru interessante de orações e tudo mais, de modo que a equipe de arte foi coesa no desenvolvimento, e o resultado embora colorido demais em neon, ficasse satisfatório, mas poderiam ter ousado mais, ou talvez até ido com algo mais singelo, já que o meio termo costuma não causar como poderia. A fotografia é exagerada de cores marcadas como o neon, o vermelho, e muitas cenas escuras com nuances, para dar o contraste realmente e mostrar o que deseja exatamente em cada cena, mas não tão efetivo como ponto final.
Enfim, é um filme muito diferente de ideias, de ações e de execuções, que não empolga, mas que consegue causar muito, e todos que forem conferir certamente terão dois pontos completamente opostos de opinião, não ficando em cima do muro de forma alguma, e dessa forma recomendo ele bem para poucos, pois acredito que a maioria não irá gostar do que verá, mesmo tendo muitos pontos interessantes para pensarmos e agirmos antes que o Brasil vire isso que é mostrado na telona. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje com a última estreia da semana, mas volto em breve com mais textos, então abraços e até logo mais.
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