O longa nos situa no verão de 1976. A Europa está passando por uma onda de calor implacável e uma das piores secas de sua história. Na fazenda dos pais, Gus (13) passa as férias lendo gibis, ajudando seu pai, que investiu todas as suas economias em um galinheiro moderno, e fugindo com Mado, a criança selvagem da aldeia. Mas lentamente ao seu redor, seu universo reconfortante e familiar começa a ruir com o calor. Sua mãe, sempre uma presença terna e gentil, começa a se afastar, passando cada vez mais tempo com a hipnotizante Cécile, enquanto seu pai se encontra sozinho para lutar contra a devastação da seca. Testemunhando a destruição de sua família nuclear, da agricultura tradicional e do patriarcado, Gus precisa crescer rápido e deixar para trás a inocência de sua infância.
A diretora Delphine Lehericey foi bem coerente ao desenvolver a trama do livro de Roland Buti, pois deu síntese e vida à toda situação sem precisar forçar os estilos, e sem precisar ir afinando cada um dos temas, dando abertura para tudo na visão do jovem garoto, ousando em símbolos e claro sentimentos, de forma que confesso que não consigo imaginar poucos traumas para tudo o que o garoto acaba sentindo, já que passa em pouco tempo de trama por tantos problemas, por uma separação imponente, por ver coisas que nunca viu, sentir coisas que nunca sentiu, além de estar num verão escaldante que não é acostumado, vendo morrer animais, conhecidos, e ainda ter toda a mudança corporal. Ou seja, a diretora acabou amplificando os temas, e fluindo todos juntos, o que é bem válido para não pesar nem a mão, nem o público, pois certamente muitos outros optariam por capitular a trama em temas, ou ainda ousariam desenvolver um ou outro tema do livro, e assim sendo foi uma grata passagem bem feita e que funciona. Porém diria que o filme ficou muito calmo dentro de toda a problematização, pois talvez com algo mais duro o sentimento seria outro, não que o que foi feito seja ruim, apenas soou doce demais toda a transformação, e sabemos bem que usualmente não é assim que tudo ocorre.
Sobre as atuações, é fato que o filme é praticamente todo do garotinho estreante Luc Bruchez, afinal o longa é todo embasado na sua visão, e o garoto andou muito de bicicleta por toda a locação, viu de tudo um pouco, mas sempre manteve o olhar sereno, trabalhou as dinâmicas em cada ato com suspeitas e só agiu nos momentos que não tinha como não explodir, ou seja, fez de seu Gus o ponto-chave da trama, e o olhar do público sobre tudo o que está acontecendo, sendo perfeito em sua estreia. Thibaut Evrard foi o elo explosivo da trama com seu Jean, usando a força para tudo, e mostrando o desespero dos atos para tentar manter a família, claro que não é o mais usual, mas o ator foi muito bem em tudo, e chamou bastante atenção. Laetitia Casta deu ao mesmo tempo para sua Nicole o ar familiar de mãe, o semblante de vivência bem colocada, como também abriu ares para o desejo, indo para rumos diferentes do tradicional, e foi bem diversa em ambos os momentos, não se prendendo para estilos, mas sim fluindo lindamente com olhares emotivos e bem colocados, que acabaram envolvendo e emocionando. Sasha Gravat Harsch também foi bem graciosa com sua Mado, mas não desenvolveram tanto seu personagem, o que é ruim, pois valeria já que tinha algo a mais para dizer, porém funcionou bem e agrada do seu modo. Clémence Poésy trouxe o lado mais sedutor para a trama com sua Cécile, e acabou chamando bem a atenção por ser o elo dos problemas, então a atriz teve de funcionar bem, e agradou sem ir muito além de expressividade, apenas trabalhando mais o clima da trama. Quanto aos demais, todos apareceram pouco, se encaixaram em cada um dos motes da trama, e foram bem, mas sem grandes destaques.
No conceito visual até chegamos a suar junto com o calor que os protagonistas sentem, matando animais e tudo mais (que conseguiram representar muito bem com tudo!) e a aridez visual que deram para a trama foi muito bem feita, escolhendo uma locação bem no meio do nada, com plantações secas, casas rústicas e muito simbolismo em cima de cada momento, sem precisar abrir muito a gama de elementos cênicos, mas trabalhando os lugares que o jovem vai, os esconderijos, as revistas, as caminhadas e corridas de bicicleta, tudo flui com leveza e harmonia para representar bem cada momento.
Enfim, é um filme bem simples de atitudes, porém bem forte de ideias, que se quisermos até dá para discutir cada momento dentro de um tema-chave, mas que não é o momento nem o lugar, então talvez em sessões temáticas o filme até se abra mais e funcione melhor para que especialistas de temas discutam e floreiem cada situação, mas como ambiente cinematográfico acabou sendo apenas bonito e bem representativo. Sendo assim até recomendo o longa para o público geral, mas confesso que será melhor apreciado em sessões tema como disse, pois vai abrir melhor cada detalhamento e o resultado será mais intenso. O filme fica gratuito para conferida na plataforma do SESC Digital nesse link até as 20hs do dia 30/08, então quem quiser aproveitar, corra! Então é isso pessoal, fico por aqui agora, mas volto em breve com mais textos, então abraços e até logo mais.
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