quinta-feira, 3 de setembro de 2020

Aqueles Que Trabalham (Ceux Qui Travaillent) (Those Who Work)

Uma coisa intrigante que não podemos negar é que hoje temos muito luxo devido claro ao capitalismo, que a economia gira, que um produto vem sabe lá de onde para matar nossa fome ou apenas pelo desejo de ter algo, porém nesse caminho todo você imagina tudo o que precisaram fazer para que esse teclado que digito o texto, ou então o produto que foi usado para fazer a batata frita que comi, ou até mesmo as peças para fazer a internet que estou usando para funcionar. Como foram as negociações, quem precisou fazer o que, tudo foi 100% moral ou tiveram percalços no meio do caminho? É com essas e outras perguntas que a trama do filme "Aqueles Que Trabalham", que estreou hoje no Panorama Digital de Cinema Suíço, brinca e tenta passar a mensagem em cima de uma família de um homem que comete um erro por não fazer algo moralmente legal, é demitido, e que passa os próximos dias pensando no que fez, e conhecendo um pouco mais de sua família. Ou seja, não é um filme que vá ter grandes ações, que entregue uma dramaticidade muito envolvente, mas que pela síntese em si do que o filme faz pensar é que acaba valendo tudo, pois hoje nos damos muito luxo, e claro muitas pessoas fazem diversas negociações erradas para que tenhamos esse luxo, mas aí é que entra a ideia de se pensar, vale a pena? E é isso que o diretor propôs, e que muitos irão refletir, enquanto outros vão apenas ver o filme.

A sinopse nos conta que após um ato desonesto, a carreira de Frank em uma companhia de frete marítimo, onde trabalhou por 20 anos, é imediatamente interrompida. Para Frank, que dedicou toda a sua vida à escalada do sucesso, revelar a razão de sua demissão para sua família é impossível. A transição entre consultor de carreira para uma vida solitária, faz com que inicie um período de auto-reflexão que o faz rever todos os seus valores.

Uma coisa que é bem interessante notar no filme é que o diretor Antoine Russbach não fez um filme para pensarmos no que acontece nas cenas, pois o ato do protagonista, a família dele, toda a demissão e sessões de re-encaixe, e até mesmo o ato com o amigo são apenas elos para mostrar o plano maior do consumismo e suas necessidades, tanto que a cena final com os filhos fazendo uso de seus luxos é a métrica perfeita para tudo o que ele ouve no bar, e isso não é algo ruim, pois vemos um filme interessante, mas que poderia estar mostrando qualquer outra coisa com a narração nos contando sobre atos legais e ilegais nos meios de consumo para que um luxo chegue até a sua casa, e quando falamos em luxo, pode ser qualquer coisa até mesmo a luz que te ilumina, uma fruta importada, ou nos países com pouca agricultura, toda a comida da mesa. Ou seja, o diretor e roteirista foi preciso na dramaticidade pensada, mas mais ainda na ideia central para que o filme ficasse inteligentíssimo, e isso faz com que ele seja daqueles longas que muita gente verá, não entenderá nada do que verá na tela, mas ao mesmo tempo irá refletir em tudo o que é passado, e isso é perfeito.

Como a história mostrada na tela em si não é algo que importe muito, as atuações também não foram tão primorosas, e com isso o rancor e trejeitos exageradamente fortes que o protagonista Olivier Gourmet entrega para seu Frank felizmente não atrapalham tanto o andar do filme, tanto que seus momentos de silêncio até soaram melhores para o resultado, do que as cenas em que acaba fazendo algo a mais, claro tirado a cena do bar que é a amarra completa da trama, então ali o ar do personagem funciona ao ponto para que ele volte e decida o que fazer, e é preciso no que faz. Quanto aos demais, nem vale perder tanto tempo observando eles, pois acabam sendo irrelevantes como atores, mas sim funcionando como encaixes para a proposta, e o resultado flui bem, tanto que os destaques são a garotinha Adèle Bochatay com sua Matilde pela proposta de conhecer o trabalho do pai e assim termos uma aula completa do consumismo/capitalismo, e Dirk Roofthooft com seu Pavel no fechamento bem colocado.

No conceito visual é bem bacana ver a vida luxuosa da família, todas suas regalias, e até mesmo o tratamento familiar, pois todos ali já estão acostumados com tudo, e perder algo da boa vida seria um peso maior, ou seja, vemos diversos elementos luxuosos, vemos o funcionamento da importação alimentícia, e vemos muito do funcionamento da vida de comerciantes de bens, e assim, a equipe de arte foi mais importante ao mostrar o ambiente em que a família está inserida num contexto de não querer perder a boa vida, do que em algo maior para a trama, de forma que tudo está ali para algo a mais, mas nem tudo é usado para esse algo a mais, pois não nos importa se ele tem 5 ou 10 filhos, todos estão ali usufruindo com suas altas contas, e para manter isso, o protagonista precisa passar por cima de qualquer moral.

Enfim, é um filme muito reflexivo, com uma proposta incrível, que talvez até pudesse ser melhor representado na tela, pois só mostrou o consumismo de uma família bem rica, mas o exemplo seria válido para qualquer uma das classes, então sendo assim diria que é daqueles que vale a conferida, e claro a reflexão sobre o quanto estamos dispostos a passar por cima de algo "legal" ou "moral" para manter nossos luxos, e claro, sabendo quantos passaram por cima de tudo para termos esses luxos também. Sendo assim, fica a dica para conferir gratuitamente o longa no link da plataforma do SESC Digital até as 20hs do dia 06/09. Bem é isso pessoal, eu fico por aqui hoje, mas volto amanhã com mais um texto do Panorama Digital do Cinema Suíço, então abraços e até logo mais.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado por comentar em meu site... desde já agradeço por ler minhas críticas...