Netflix - Bigbug

2/13/2022 03:55:00 PM |

Costumo dizer que a comédia francesa é uma das melhores do mundo, mas como o gênero tem várias subdivisões, a comédia abstrata ou do absurdo como alguns denominam deles também é uma das piores que tem, pois ao forçar o riso e criar coisas meio que irreais acabam indo para um rumo exageradamente fora de tom, que tudo acaba parecendo tão bizarro e sem noção que não tem como se divertir com o que é entregue, e assim sendo só quem realmente ama o estilo acaba gostando, ou aquelas pessoas que riem de qualquer coisa vão rir das besteiras jogadas. Ou seja, a estreia da semana da Netflix, "Bigbug", tentou ir para o lado de um futuro meio que sem sentido, brincando com o "ser" humano, trabalhando sentimentos e sensações para os androides, que até possuem seus gracejos, mas esqueceram os atores de lado e lhe deram diálogos e ações tão bizarras e bobas que não tem como se envolver com nenhum, ao ponto que no somatório cenografia interessante por brincar com o futuro em uma casa vintage da época, o ambiente clausura para tentar salvar seus humanos por parte dos androides, com um texto ruim e bobo demais, exagero de um único sentido, e atuações jogadas, o filme não empolga e nem faz rir, coisas obrigatórias para uma comédia.

A sinopse nos conta que em 2045, a inteligência artificial está em toda parte. Tanto que a humanidade confia para satisfazer todas as suas necessidades e todos os desejos, mesmo os mais secretos e perversos. Em uma área residencial tranquila, quatro robôs domésticos de repente decidem fazer seus mestres reféns em sua própria casa. Trancados juntos, uma família não tão misturada, uma vizinha intrusiva e seu robô sexual agora são forçados a aturar um ao outro em uma atmosfera cada vez mais histérica. Enquanto, lá fora, os Yonyx, a última geração de androides, tentam assumir o controle. À medida que a ameaça se aproxima, os humanos olham para outro lugar, ficam com ciúmes e se atacam sob os olhos perplexos de seus robôs internos. Talvez sejam os robôs que têm alma ou não.

O potencial do diretor Jean-Pierre Jeunet é inegável, tanto que tem em seu currículo grandiosas obras do cinema francês lúdico, aonde viajamos histórias incríveis com "O Fabuloso Destino de Amèlie Poulain" e "Uma Viagem Extraordinária", porém aqui ele quis forçar demais com tudo e acabou saindo um pouco demais do eixo, deixando que a bizarrice tomasse mais conta da cena do que o ensejo por buscar alma e sentimentos em robôs. Claro que é um filme que tem uma proposta de discussão também, e o diretor quis colocar isso em pauta, porém faltou dar aquele tino fantasioso mais romantizado, ou então envolver alguma dramaticidade mais eloquente, ou até mesmo manter o absurdo como quis, mas que deixasse todas as situações menos teatralizadas, e ousasse em dar sentido para tudo, que aí sim o filme iria para algo muito melhor, e o diretor conseguiria mostrar muito mais de seu estilo na tela. Ou seja, é daqueles filmes que esqueceremos fácil em que a proposta é maior do que o conteúdo, e talvez gastaram até demais na cenografia e nos efeitos, esquecendo que a base de uma boa comédia francesa é o roteiro. 

Sobre as atuações, diria que é um misto tão bagunçado de coisas que nem dá para dizer que foram bem no que fizeram, ao ponto que o destaque mesmo são para os diálogos das vozes dos robôs Einsten de André Dussolier e das dinâmicas feitas pelo robô Greg de Alban Lenoir que demonstrou ser um gigolô completo que em breve será vendido para as mulheres. Quanto dos humanos, tivemos um ar meio que mistura de clássico exagerado com desespero por parte de Elsa Zylberstein com sua Alice, um ar piegas e forçado por Stéphane De Groodt com seu Max, e um estilo misto de diferenças juvenis entre Marysole Fertard e Hélie Thonnat com sua Nina e Leo, enquanto a vizinha vivida por Isabelle Nanty ficou meio que deslocada em cena, e o ex-marido vivido por Youssef Hajdi soou meio que perdido também. Ainda posso dar um leve destaque para as duas estranhas da casa vividas por Claude Perron com sua governanta-robô Monique por tentar a todo momento ser uma mulher de verdade para os homens da casa, usando até o mesmo perfume e penteado que as demais, e para a loucura desenfreada de Claire Chust com sua Jennifer, afinal teve atitude pelo menos. Agora sem dúvida o ar mais bizarro de expressão ficou a cargo de François Levantal com seu Yonyx 7389XAB2, que forçou demais a barra para ficar com um ar violento, fazendo trejeitos fortes e dinâmicas bem diretas, mas sem um estilo próprio que ficasse mais realista com tudo o que colocava nas suas cenas.

Visualmente o longa é quase uma peça, pois se passa praticamente todo em uma sala conjugada com a cozinha, com raras saídas para os quartos ou a lavanderia da casa, mas tendo muitos elementos cênicos bem marcantes, vários livros, vários computadores e objetos antigos, para dar um ar vintage para todo o  ar futuro da obra, e que brincando com isso o tempo todo, a trama ousa ainda ter um outdoor móvel oferecendo vários itens para os personagens nas janelas, vários elementos gráficos externos bem desenhados de forma computacional, mostrando que a equipe queria um algo a mais, além disso brincou bem com símbolos e detalhes que até fazem rir mais do que o próprio texto, e assim sendo diria que conseguiram até ir além nesse quesito.

Enfim, é um filme que veio com uma proposta até que ousada de diversão, que se tivesse dado certo seria incrível, mas que falhou tanto nos diálogos e nas interações, que acaba mais irritando pelos absurdos do que envolvendo de uma forma geral, e assim sendo não dá para recomendar o longa para ninguém. E é isso pessoal, fico por aqui agora, mas ainda vou tentar salvar o dia mais tarde no cinema, então abraços e até logo mais.


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