A Médium ('ร่างทรง') (The Medium)

5/20/2022 01:34:00 AM |

Costumo dizer que um bom filme de terror não é aquele que te assusta e faz ficar pulando da poltrona, e menos ainda aquele que cria situações que você não entende nada e tentam passar algum tipo de mensagem estranha (os famosos terror-cult), e muito menos aqueles que exageram na sanguinolência voando para todos os lados, mas sim aquele que você acaba entrando completamente no clima, se interessa pelos personagens, a tensão ocorre, as dinâmicas arrepiam, e que mesmo sendo algo bizarro, nojento e completamente absurdo de pensar (mesmo sabendo que existem seitas e cultos estranhos assim), no final você fica pensando o que foi isso minha gente! E já fazia um bom tempo que não via um longa com todas essas qualidades no cinema, ao ponto que no final de "A Médium" já estava pensando que tem seitas que chamam realmente alguns documentaristas para gravar seus cultos e os malucos vão lá, depois de verem e alguns mesmo vendo o pau torando continuam gravando como ocorre aqui, pois confesso se sou eu com a câmera largava ela lá e adeus no primeiro grunhido que ouvisse, quanto mais ver o amiguinho câmera do lado sendo comido e ficar dando close. Ou seja, sei que muitos vão conferir e odiar tudo, achar tudo absurdo e impossível, mas a ideia toda me fez lembrar um pouco "A Bruxa de Blair", só que com muito mais intensidade no tratamento final, já que aqui não quiseram fazer imagens estranhas, mas sim uma documentação precisa e bem feita com muitas câmeras, uma equipe completa, entrevistas, e tudo mais, e com um começo que muitos vão até pensar que o trem não vai engrenar, mas é bem uma preparação para tudo, e cada coisa dita no miolo é bem utilizada, fazendo da trama um dos melhores que vi do gênero em muitos anos.

A sinopse nos conta que uma equipe de documentários tailandeses viaja para a parte nordeste da Tailândia para documentar a vida cotidiana de uma médium local, Nim, que é possuída pelo espírito de Bayan, uma divindade local que os aldeões adoram. Bayan é uma deusa ancestral e possui mulheres na família de Nim há gerações. A última na linha de sucessão foi a irmã de Nim, Noi. No entanto, Noi não queria ser médium e se voltou para o cristianismo. O espírito de Bayan mudou-se para Nim e está com ela desde então. Após a mulher fazer uma revelação horripilante sobre a família de sua irmã, sua sobrinha Mink, começa a exibir comportamentos estranhos. Nim está inicialmente convencido de que Bayan deseja que Mink seja a sucessora de Nim, mas Noi se recusa a deixar Nim realizar uma Cerimônia de Aceitação para mover o espírito de Bayan para sua filha. Mas, a deusa que eles tanto adoravam, talvez não seja o que sempre acharam.

O jeito que o diretor Banjong Pisanthanakun escolheu desenvolver sua história foi algo brilhante de observar, principalmente para um filme de terror, afinal entregar um documentário inicialmente sobre uma religião/entidade numa comunidade meio que isolada e devota à ela, depois perceberem a possibilidade de documentar a transferência dessa entidade para outro ente da mesma família, e sem ficar com diálogos da equipe, mas sim deixando a fluência para a família em si, como se as câmeras fossem algo cotidiano ali é algo muito diferenciado, pois em certos momentos nem vemos mais os personagens respondendo as perguntas da equipe, mas sim apenas reagindo a tudo e a equipe pouco se lixando se ia morrer ou se aquilo ali estava quebrando a privacidade ou qualquer coisa que um documentarista pensaria, e isso deu um sentido completamente maluco para a trama nos atos finais aonde qualquer um fugiria, ou se esconderia como rolou com um dos membros (claro sem parar de filmar!), e assim tudo é perfeito nesse sentido, aí entramos no conceito de terror e filmes com entidades, pois diferente de um monstro ou espírito assombrando, aqui vemos não só a incorporação, mas o acreditar naquilo, de quão forte é tudo, e como algumas pessoas entram na ideia religiosa mesmo sem saber o que é realmente, tanto que o último depoimento de Nim que é o fechamento do filme diz tudo, então é o terror acontecendo da forma mais crua e tensa na tela, e isso embora nojento, forte e intenso, é lindo de ver. Ou seja, o diretor fez um filme que é o que ele queria, sendo ficção, mas que passaria facilmente num festival de documentários reais, e alguns do júri dariam boas notas.

Sobre as atuações, só posso dizer que todos foram muito naturais no que fizeram, parecendo realmente pessoas comuns na comunidade, que vivenciaram toda a insanidade dos rituais, de tal maneira que se entregaram para tudo, e até mesmo o tio estranho vivido por Yasaka Chaisorn ficou muito bem encaixado com a família dele quando parecia meio que jogada no longa. E assim sendo a jovem Narilya Gulmongkolpech inicialmente comum com sua Mink, apenas exagerando nas bebidas e brigas ocasionais de jovens, mas depois virando o próprio demônio com dobras corporais, olhares revirados, saltos, cenas obscenas, coisas nojentas e tudo o que se pudesse pensar numa incorporação demoníaca que dá muito certo de ser vista, ou seja, foi muito bem no que fez. A tia vivida por Sawanee Utoomma fez uma Nim bem densa, com olhares reflexivos, e tradicionais de uma pessoa mística, rezando muito, fazendo seus cultos e oferendas, e sendo bem direta nos depoimentos, sendo a protagonista real de seus atos, o que é perfeito de ver. Sirani Yankittikan trabalhou sua Noi de uma forma bem desesperada, tradicional de mães, e se jogou literalmente na personalidade que precisava, agradando bem em todos os atos e finalizando ainda melhor. O outro guia espiritual Santi, que Boonsong Nakphoo fez ficou meio explosivo demais, com trejeitos até falsos e estranhos, mas que é comum de ver em rituais, então fez bem seus atos finais, e agradou. Agora Arunee Wattana poderia ter feito uma Pang um pouco melhor e mais convincente, pois pareceu perdida em alguns atos, porém foi pouco usada, o que acabou não atrapalhando a produção. Quanto dos diversos câmeras, produtores e diretores do documentário, eles apareceram quase nada em cena, e falaram menos ainda, mas seus gemidos finais, suas fugas e tudo mais foi algo bem bacana de ver.

Quanto do visual, o filme se passa todo na comunidade, e tendo um galpão de uma fábrica para os ritos mais tensos, então é uma casa bem simples, o emprego da jovem com várias mesas e cadeiras sem grandes chamarizes, uma parada natalina bem comum, muito matagal, e claro câmeras noturnas, câmeras acompanhando cada um, um culto mais calmo, um mais cheio de pessoas diferentes e malucas, e claro o grandioso fechamento com um culto assustador, além de alguns ritos de funerais bem culturais e interessantes, ou seja, pareceu realmente que a equipe foi para alguma cidadela e filmou todo o cotidiano ali acontecendo, o que é perfeito de ver, e que mesmo abusando de algumas luzes falsas, o resultado impacta bem com muito sangue, vômitos, coisas nojentas e até atos sexuais bem explícitos, ou seja, o conjunto de um terror completo.

Enfim, é daqueles longas que funcionam demais dentro do proposto, que até tem falhas, mas que são relevantes, e usando duas ou três pequenas cenas de jumpscare para pegar o espectador (mas que você estará preparado para elas se conhecer um pouquinho de filmes de terror), o restante é apenas o luxo do mais tenso estilo de terror, e isso faz valer demais a recomendação para quem gosta de um bom filme do gênero. Então fica a dica, e eu fico por aqui hoje deixando meus abraços e até breve, pois essa semana está bem cheia de estreias.

PS: Só não dei a nota máxima para o longa por alguns exageros e pequenas falhas, mas é algo que dá para relevar e colocar ele no top filmes do ano.


2 comentários:

'lana disse...

Sua review me fazendo querer assistir. Eu vi o nome do diretor e reconheci de dois outros filmes muito bons, Shutter e Pee Mak, adoro filme de terror tailandês. São sempre muito intrigantes, de qualidade ou muito engraçados, o que também é muito bom. Diferentes dos filmes de terror com ou sem humor, americanos.

Vou procurar pra assistir com certeza, valeu pela indicação. Aliás achei seu blog por uma review muito antiga de opera e acabei ficando por aqui, porque gostei da forma como você conta a história e constatações, e como avalia o que assiste. Até mais!

Fernando Coelho disse...

Olá 'lana... que bom que veio e ficou!!! Me indicaram mesmo outros do diretor, vou tentar arrumar pra ver, mas olha... ainda bem que os terrores são bons que os dramasssssss... jesus... já quase dormi em 2!!! Abraços e volte sempre para comentar!!

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