Globoplay - O Pai Da Rita

7/24/2022 05:52:00 PM |

Costumo dizer que o cinema nacional tem dois vértices bem marcados que é a comédia nacional rentável que funciona bem nos cinemas, vendendo ingressos e recuperando o investimento para que sejam feitos outros filmes do estilo, e assim subsequentemente, e os filmes feitos para festivais, que não dá nem para classificar como cinema independente como ocorre lá fora, pois arrumam um dinheiro, fazem o filme, e o retorno é zero, apenas sendo exibido em festivais aonde pouquíssimas pessoas veem, aplaudem o diretor e nada mais, pois é algo que ninguém consegue conferir por inteiro numa sessão em casa, ou então vem abarrotado de esquetes que não se amarram, precisando fazer uso do fade black (a famosa apaga e acende da tela para mudar de locação ou ideia). Infelizmente o longa "O Pai da Rita" se encaixa nesse último estilo, que ao meu ver é o pior de todos, pois fica parecendo que o diretor não tem uma ideia de continuidade para sua trama, apenas vários momentos que são exibidos e que fazem parte de um todo, mas que juntos não dão uma linearidade temporal, ou seja, é um filme que tem uma base sólida em cima da canção de Chico Buarque, aonde dois amigos discutem quem é o pai da garota depois de anos, e isso daria muita brecha para um desenvolvimento, mas até chegar nesse ponto o longa enrosca tanto, enfeita tanto mostrando a apresentação de quem são realmente os compositores, a malemolência deles, a galinhagem e tudo mais, que quando acontece pra valer já estamos quase nos minutos finais do filme, e isso desaponta bem, que até pode servir como algo representativo do samba, mas que não funciona como cinema.

A sinopse nos conta que Roque e Pudim são dois compositores da velha guarda da Vai-Vai - escola de samba de São Paulo - partilham uma kitnet, décadas de amizade, e o amor por suas carreiras na escola de samba prestigiada do estado. Mas, uma dúvida do passado sempre atormentou os dois amigos: o que aconteceu com a passista Rita, paixão de ambos? É quando o surgimento de Ritinha, filha da passista - e também passista - surge para desvendar esse mistério - todavia, também ameaça desmoronar essa grande amizade, assim como aumentar mais ainda o número de perguntas. O longa se desenvolve a partir de uma disputa de paternidade, travada pelos dois sambistas e velhos amigos, com roteiro inspirado livremente nas músicas “A Rita” e “O Samba de um Grande Amor” de Chico Buarque. Quem será o pai de Ritinha e qual motivo a levou pela procura do pai?

Diria que o diretor Joel Zito Araújo desejava fazer uma homenagem à velha guarda da escola de samba Vai Vai e escreveu seu filme com as dinâmicas possíveis para que isso acontecesse, usando como base as canções de Chico Buarque, porém temos músicas que dão toda a letra de uma trama, que basta desenvolver bem e o resultado acaba chamando a atenção, e outras tem apenas momentos, aonde é necessário entrar um bom roteirista para capitanear tudo e fazer com que o filme tivesse um eixo realmente, o que não aconteceu aqui, então o que o diretor ou no caso o montador faz, pega o botão de fade e sai colocando do começo ao fim, parecendo vários dias, vários momentos e tudo mais, o que não é legal de ver. Ou seja, aqui o problema vem da base, de não ter um roteiro forte, depois passado para várias cenas soltas que até chamam a atenção pela síntese toda, e o terceiro na desenvoltura da trama, que usou quase que 80% da trama para apresentar o jeitão dos protagonistas, e apenas 20% para o restante que é o conflito realmente do filme, e assim o resultado é algo até que homenageia bem a escola, mas que quem não for sambista ou rato de carnaval vai ver e falar ok, dois segundos depois já esqueceu o que viu, o que é uma pena para uma obra.

Sobre as atuações, escolheram ao menos o ator perfeito para o papel, pois Aílton Graça é 100% samba, entende como ninguém a desenvoltura de uma composição musical de escolas de samba, e se entregou completamente para o papel de Pudim, com trejeitos bem marcados, malemolência e galanteio de primeira, e claro disposição para entregar tudo que o papel pedia, agradando bastante, mesmo nos atos mais bizarros, e assim funcionando bem no que precisava fazer. Da mesma forma, Wilson Rabelo fez seu Roque complementando exatamente o lado que faltava no amigo, já sendo mais contido, mas amoroso e cheio de estilo, fazendo quase que um só deles dois, o que é bonito de ver, resultando numa boa química e até mesmo em boas brigas nos atos finais, que merecia até ter rolado um pouco antes. Quanto aos demais, a maioria faz boas conexões com os protagonistas, mas quase nem são usados, tendo o destaque claro para Jessica Barbosa com sua Ritinha geradora da confusão toda, Elisa Lucinda com sua Neide toda fogosa, Nathalia Ernesto com sua Gracinha e Lea Garcia com Tia Neguita que faz toda a interligação dos personagens, além dos donos dos bares e restaurantes do Bixiga, Francisco Gaspar como Macaxeira e Paulo Betti como Sauro.

Visualmente a trama tem a base na kitnet dos protagonistas, algumas passadas na quadra da escola e nas rodas de samba, um bar bem simples, um restaurante mais requintado porém sem grandes luxos, e a casa da Tia Neguita, tudo bem trabalhado para ser representativo sem grandes cenários ou elementos cênicos, que dão um certo gracejo para a trama, mas nada demais, funcionando apenas para acontecer os diálogos e envolvimentos, e assim fazendo o famoso arroz com feijão na trama.

Enfim, é um filme que não posso dizer que seja ruim, apenas não posso colocá-lo como realmente um filme, e sim uma homenagem bonita aos compositores que vivem juntos e acabam brigando por coisas que nem deveriam causar brigas, e assim sendo vou esquecer dele muito brevemente. Ou seja, apenas indico ele se você for do mundo do samba/carnaval, do contrário tem outros filmes sobre o tema melhores espalhados por aí. E é isso meus amigos, fico por aqui agora, mas volto em breve com mais textos, então abraços e até logo mais.


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