Diria que a diretora e roteirista Audrey Diwan, que inclusive foi indicada a melhor diretora no Bafta desse ano, foi muito ousada em se basear no romance de Annie Ernaux e conseguir entregar um filme que se passa nos anos 50/60, mas que facilmente se enxerga muito da atualidade mundial, e com toda certeza aonde o longa passa é recheado de polêmicas, de sussurros, de pessoas contra a exibição e tudo mais, mas que por ser uma direção feminina conseguiu enxergar com um vértice tão imponente do assunto, tão bem embasado, que qualquer coisa que falarmos vai ser pouco nas vozes e sentimentos mostrados na tela, pois é um filme único do gênero com propriedade, e que as garotas atrizes literalmente se entregaram de corpo e alma para todos os momentos do filme, não tendo ceninhas bobas para divertir, nem cenas jogadas que não funcionassem dentro do tema, ela pegou cruamente tudo, pôs o machismo no cantinho certo de ficar e fez brilhar a história, que facilmente daria para ser muito mais longo, poderia abranger mais temáticas, poderia ser até mais doce caso ela quisesse, mas não, ela foi lá e nem bateu com luva de pelica, foi com taco de beisebol de aço mesmo na cara de quem fosse assistir, e assim sendo marcou pontos máximos.
Sobre as atuações, Anamaria Vartolomei caiu como uma luva para o papel de Anne, entregando um semblante sério, com personalidade, disposta a fazer tudo e se doar para o papel, fazendo os trejeitos de dor, mas não sendo daquelas com olhares tristes que ficamos com pena, mas sim uma mulher determinada no que desejava e claro desesperada também com o tempo e com tudo o que vai acontecendo, agradando demais. Kacey Mottet Klein teve boas dinâmicas com seu Jean, mas ao mesmo tempo que foi amigo e ajudou em alguns atos, num primeiro momento foi extremamente machista, mas fazendo o que muitos infelizmente fariam, de abusar da pessoa já desesperada, mas quando volta com um ar de culpa, de que viu que fez besteira, foi bem trabalhado nos olhares e acabou acertando também. Chega a ser assustador os olhares e pensamentos das "amigas" Hélène e Brigite vividas por Luàna Bajrami e Louise Orry-Diquéro respectivamente, que aparentavam ser coladas com a protagonista, com a segunda mostrando ser uma exímia conhecedora da arte sexual, sem ter feito, mas quando a jovem mais precisou ficaram de lado, julgaram e não ajudaram, com falas até depreciativas para a garota que "não teve sorte". Já Louise Chevillote com sua Olivia que aparentemente não se dava com a protagonista é a famosa que acaba ajudando no ato mais forte e faz muito bem as expressões de medo e desespero no que estava fazendo ali. Anna Mouglalis foi muito imponente com sua Madame Rivière, fazendo nuances fortes e chamativas, sendo discreta e direta no ato, mostrando muito conhecimento. Ainda tivemos bons atos marcantes com Pio Marmaï com seu Professor Bornec e Fabrizio Rongione com seu Doutor Ravinski, sendo ambos mais conexões, mas fazendo bons ensejos nos atos com a protagonista, e claro Julien Frison sendo o "pai" que só quer os louros na hora da diversão, na hora de ajudar cai fora. Já os pais da garota acredito que foram pouco usados, mesmo aparecendo bastante, mas só serviram para mostrar a relação familiar mesmo, nada de grandioso, aliás acho que faltou mostrar um algo a mais ali, talvez a jovem contar para explodir tudo, ou não.
No contexto visual trabalharam bem os bailes no campus estudantil, a vida das garotas nos alojamentos, todo o procedimento que a jovem tenta num primeiro momento e depois o procedimento com a especialista, vemos algumas consultas em médicos com pareceres semelhantes, mas bem trabalhados no conceito visual, temos os figurinos bem alocados, a casa simples da família, as aulas, mas faltou uma contextualização de época melhor, pois o aborto foi legalizado na França em 1975, então qualquer período anterior a isso se encaixa na trama, mas sempre é bom dar toda a dinâmica voltada para um tempo que agradaria um pouco mais, mas nada que atrapalhe toda a perfeição da trama e a riqueza visual feita.
Enfim, é um filme muito bem feito, com uma proposta bem pautada e interessante de ser discutida, que serve bem tanto para uma conferida ocasional pensante que recomendo com certeza, mas que valerá muito para ser exibido em discussões do tema em palestras e cursos, pois é o famoso recorte que serve perfeitamente para uma boa discussão. E assim sendo recomendo muito o longa, daria um 9,5 se tivesse notas quebradas talvez por faltar um pouco mais da discussão familiar e da contextualização da época exata, mas que em nada incomoda quanto ao propósito da trama. E é isso meus amigos, uma pena que só teve uma sessão dele no Varilux daqui, irei torcer para voltar comercialmente para indicar no cinema para mais amigos, e fico por aqui hoje, então abraços e até logo mais.
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