Obrigado Rapazes (Grazie Ragazzi)

11/04/2023 12:34:00 AM |

Certa vez discutindo estilos cinematográficos um amigo me questionou o motivo de nos festivais, principalmente de filmes europeus, existirem muitas comédias dramáticas (as famosas dramédias como muitos apelidam), e a resposta que dei foi bem simples, pois eles são os poucos que conseguem trazer no mesmo filme algo que faça você rir aos montes e também lavar o cinema com a emoção na medida certa. Claro que também aparecem muitas bombas que não atingem esses critérios, mas a grande maioria que chega ao menos aqui no outro continente geralmente é perfeita, e hoje com "Obrigado Rapazes", que poderá ser conferido a partir de quarta 08/11 em cinemas de várias cidades e online no site do 18° Festival de Cinema Italiano, eu me vi arrepiado com algumas cenas, escorrendo algumas lágrimas em outras e rindo muito em vários momentos, ou seja, a essência básica do estilo atingida ao máximo numa obra que contém um pouco de tudo, muito envolvimento por parte dos atores, e mais do que isso, consegue mostrar a chamada tentativa de socializar presidiários com algo fora das grades, e claro que o teatro ao menos ajuda eles a encontrarem outras facetas e a ter com o que se ocupar com os roteiros de peças. Ou seja, é um filme tão bem formatado que vale demais a conferida, e que sendo uma adaptação de um filme francês de 2020, acho que vou fazer o teste se irá me emocionar com ele também.

A sinopse nos conta que diante da falta de ofertas de emprego, Antonio, um ator apaixonado, mas muitas vezes desempregado, aceita um emprego que lhe é oferecido por um velho amigo e colega, muito mais experiente que ele, como professor de uma oficina de teatro em um instituto penitenciário. Hesitante a princípio, descobre talento na improvável companhia de presidiários e isso reacende sua paixão e vontade de fazer teatro, a ponto de convencer a severa diretora penitenciário a cruzar os muros da prisão e encenar a famosa comédia de Samuel Beckett “Esperando Godot” em um verdadeiro palco de teatro. Dia após dia, os reclusos rendem-se à determinação de Antonio e deixam-se levar, descobrindo o poder libertador da arte e a sua capacidade de dar propósito e esperança para além das expectativas. Assim, quando chega o sinal verde final, começa uma viagem triunfal.

Não assisti ao longa francês "A Noite do Triunfo" no qual o diretor e roteirista Riccardo Milani se inspirou para fazer sua versão, mas posso dizer que aqui ele soube trabalhar tão bem alguns fatores que acabam fazendo com que tudo seja muito fluido na tela, de modo que mesmo sendo presidiários acabamos nos conectando com todos os personagens, conseguimos saber exatamente aonde tudo irá chegar para cada um deles, e sentimos toda a emoção do professor/diretor teatral que certamente passa na tela bem a síntese real de um diretor ao ver seus alunos brilhando e sendo aplaudidos, pois tudo funciona demais, tendo conexões e dinâmicas tão precisas que mesmo nos atos mais pesados, o resultado acaba aparecendo com muita leveza, e ao final você fica pensando, eles não vão fazer isso, e aí é que entra a sacada completa do texto que estão interpretando "Esperando Godot" que numa toma magistral acaba indo para outros rumos e aí é só aplaudir. Ou seja, o diretor meio que passou a bola para o ator que faz o diretor da peça sentir a demanda, tanto que você não vê a mão de Riccardo Milani na tela, mas sim a síntese toda acontecendo por parte dos demais, e isso é lindo quando ocorre, pois nos diverte e agrada com minúcias.

Quanto das atuações, a base completa de carisma e envolvimento fica a cargo de Antonio Albanese com seu Antonio, no caso o diretor/professor de teatro, que começa com cenas cômicas de nível máximo dublando filmes adultos, e sua chegada na prisão é algo que não tem como não rachar de rir, mas logo que desenvolve o trabalho com os presos, vamos vendo bem um ar de paixão tanto pelo teatro como por ensinar os presidiários a irem além, e o ator soube passar tudo com gestuais e olhares no melhor estilo possível, agradando demais do começo ao fim, e aliás que final ele entrega, ou seja, deu show. Sonia Bergamasco também teve alguns bons atos com sua Laura, a diretora do presídio, trabalhando com um ar mais fechado e duro, mas conseguindo conectar bem seus momentos, e envolver bastante conforme o longa se desenvolve, sendo imponente, mas tendo um pouco de doçura no interior. Logo de cara já ficamos com o dois pés atrás do personagem de Vinicio Marchioni, Diego, pois sendo meio que um chefão da cadeia, o ator impõe muito quando pede para entrar na trupe teatral, mas se doa bastante, tem atos fortes, e consegue nos cativar com as viradas de trama, emocionando também com seu jeito de atuar, ou seja, foi bem demais. Já o Aziz que Giacomo Ferrara faz é tão doce e determinado, que de cara parece ser aquele que está ali realmente para interpretar, tendo desenvolturas bem encaixadas e dinâmicas na medida para agradar por completo. Giorgio Montanini já trabalhou o lado mais explosivo e cômico com seu Mignolo, tendo toda a desenvoltura com sua esposa fogosa, e claro botando sacadas bem próprias na peça e nas dinâmicas, o que acaba funcionando bastante. E por fim ainda tivemos Andrea Lattanzi com seu Damiano gago e que não sabia ler nem escrever, emocionando com dinâmicas tão bem pautadas pelo professor, que acaba indo num fluxo tão bem encaixado que não tem como não se envolver, sendo perfeito em cena. Ainda tivemos algumas participações de Fabricio Bentivoglio com seu Michele e Liliana Bottone com sua Marianna, mas sem dúvida entre os secundários vale o destaque para Bogdan Iordachiou com seu Radu fazendo uma participação incrível na peça, que não dava nem para imaginar, entre muitos outros bons personagens.

Visualmente a trama é bem trabalhada dentro de um presídio limpíssimo e até bonito de ver, que chega a parecer uma escola de tão organizado, mas como sabemos que mundo afora temos presídios desse estilo, o resultado acaba mostrando algo bem trabalhado, vemos uma sala de teatro bem simples, porém com palco e tudo bem encaixado para os ensaios, vemos algumas cenas inusitadas em cabines de visitas, e até mesmo nas celas com os jovens ensaiando aos gritos, mas principalmente o mais bonito é ver a peça pronta em vários teatros da Itália, alguns bem famosos, outros menores, e claro todo o brilho dos protagonistas em verem o dia e tudo fora das grades, mostrando muita representatividade nos devidos momentos, o que chama muita atenção no trabalho da equipe de arte.

Enfim, é um filme delicioso de conferir, que recomendo demais para quem gosta do estilo, sendo daqueles que as emoções fluem facilmente, e o resultado ainda consegue impressionar bastante. Sei que talvez me arrependa de dar a nota máxima para ele, pois dava para alguns atos serem mais trabalhados, mas tirar um ponto completo é um pecado para um filme que me tirou várias sensações durante a conferida, então fica a dica, e eu fico por aqui hoje, mas volto amanhã com mais dicas, então abraços e até logo mais.


0 comentários:

Postar um comentário

Obrigado por comentar em meu site... desde já agradeço por ler minhas críticas...