O Sabor da Vida (La Passion de Dodin Bouffant) (The Taste of Things)

4/12/2024 12:40:00 AM |

Como bem sabemos a gastronomia francesa é cheia de requinte, e costumeiramente eles gostam de fazer filmes com comidas, e confesso que pra um gordo como eu assistir filme de comidas é quase uma tortura, mas felizmente cinema não tem cheiro, no máximo você sente as pipoqueiras da bombonière quando tá acabando de estourar, mas como sento longe da entrada, dá para não ficar tão maluco, porém já adianto, não vá conferir "O Sabor da Vida" com fome, pois dos 135 minutos do filme, eu diria que pelo menos uns 100 é cozinhando, e com um grupo de amigos degustando as coisas mais deliciosas e requintadas, de tal forma que diria que é um filme lindo para ver, mas que mesmo tendo dois ganhadores de diversos prêmios de atuação, na parte dramatizada do longa sem ser as de comida, acabaram errando um pouco no tempero, não chegando a ser algo ruim de ver, mas sem dar spoilers, o chef quando acontece algo perde literalmente o amor na cozinha, e deixa tudo meio que insosso na tela. Ou seja, souberam brincar com as palavras gastronômicas, e com o visual em si da trama, num trabalho de direção de arte impecável, mas diria que faltou adoçar um pouco mais tudo para que o longa fluísse melhor.

O longa retrata o relacionamento entre Eugenie, uma talentosa cozinheira, e o famoso gourmet Dodin, para quem ela trabalhou nos últimos 20 anos. Com o tempo, a prática da gastronomia e a admiração mútua se transformaram em um relacionamento. A parceria entre eles resulta em pratos incríveis, cada um mais delicioso do que o outro, desafiando até os chefs mais renomados do mundo. No entanto, Eugenie preza por sua liberdade e nunca quis se casar com Dodin. Então, ele decide fazer algo que nunca fez antes: cozinhar para ela.

Diria que o diretor e roteirista Anh Hung Tran adaptou até que muito bem o livro de Marcel Rouff, principalmente por conseguir mostrar a verdadeira paixão nos alimentos, em fazer a comida e mais do que isso, de saber e ter o dom de trabalhar cada detalhe de um preparo, de tal forma que as cenas iniciais é quase um balé na cozinha, com os protagonistas fazendo um banquete desde a colheita dos alimentos da horta até a chegada na mesa, passando por muitos preparos e degustações, aonde a câmera vai acompanhando a movimentação, vai trabalhando cada elo de forma detalhada que não tem como não se apaixonar, e nesse sentido o longa é incrível, porém no conceito dialogado e de história em si, diria que faltou apresentar melhor os amigos que vivem comendo os pratos do chef, faltou criar um vínculo mais forte entre todos os personagens, e até mesmo emocionar mais na composição toda, pois em alguns momentos parecem ser atos tão soltos que temos de pegar cada personagem como se fosse um ingrediente e ir adicionando para montar tudo em nossa cabeça, e dessa forma não engrena tanto quanto poderia. E dessa forma dava para talvez até dar uma cortada em alguns momentos para que o filme ficasse no máximo em uns 100 minutos, que cansaria menos e problematizaria menos, pois é bacana ver como uma quebra muda um cozinheiro de mão cheia, mas não deu a liga que precisava para ficar saboroso e perfeito como as comidas feitas na tela.

Quanto das atuações, Juliette Binoche é magistral em qualquer papel que lhe entreguem, sabendo mudar completamente postura, trejeitos e tudo mais para que um personagem seu não seja igual a qualquer outro que já tenha feito, e aqui sua Eugenie é a rainha da cozinha, trabalhando sem parar, provando com gosto cada um dos alimentos, passando sinceridade na emoção com a jovem aprendiz, ajudando o chef em tudo o que precisa, e transmitindo tudo com olhares brilhantes que conseguem nos prender na tela, ou seja, deu show em todos os seus atos. Não ficando atrás Benoît Magimel trouxe para seu Dodin um estilo mais fechado, com nuances até meio que empossadas, mas tendo um humor bem encaixado na trama ele consegue cativar em muitos dos atos, só ficando meio que depressivo e chato demais nos atos finais, mas com um motivo justo, e que fez sentido para a proposta do longa. Ainda tivemos atos bem interessantes com os vários amigos que comem na casa, tendo Patrick D'Assumçao um pouco mais de destaque com seu Grimaud, mas como já disse não foi bem explicado o que eles eram para estar sempre comendo ali na casa do chef, o que ficou um pouco estranho, mas alguém tinha de comer toda aquela comida, porém quem teve realmente um grande destaque foi a garotinha Bonnie Chagneau-Ravoire que trabalhou tanto as expressões de sua Pauline aprendendo a cozinhar com os cozinheiros, e principalmente passando emoção em cada comida que experimentava que acabou indo bem além do que uma mera personagem secundária e indo bem como coadjuvante na trama, passando por cima até de Galatéa Bellugi com sua Violette.

Visualmente o longa se passa no final dos anos 1800 e a equipe caprichou nos figurinos de época, mas isso não foi nem 10% do longa, pois o tanto de comida que é feito na tela, e sim, foram feitos (claro que por cozinheiros profissionais e não pelos atores) todas as comidas em cena, ou seja, a felicidade da equipe do longa deve ter sido gigantesca, pois com certeza sobrava algo para degustar nos intervalos entre um corta e um ação. E como disse no começo é um verdadeiro banquete sendo construído em cena, com dezenas de procedimentos, e muitos tipos de alimentos, panelas e tudo mais bem representado na tela.

Enfim, é um filme que chama atenção, que tem seu charme, e que vai ganhar o público pelas muitas cenas de preparo dos alimentos, além de como já disse no começo usa bem os modos alimentícios para criar as situações de falta de açúcar, de calor humano, entre muitos outros, mas que dava para ter trabalhado um pouco melhor a história e as apresentações para que ficasse mais completo, então diria que alguns vão se cansar mais do que gostar do que verão na tela, mas quem for disposto a ver comidas, vai que é sucesso. E é isso meus amigos, fico por aqui hoje, mas volto amanhã com mais textos, então abraços e até logo mais.


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