Trilha Sonora Para Um Golpe de Estado (Soundtrack to a Coup d'Etat)

1/26/2025 01:58:00 AM |

Costumo dizer que todo documentarista tem um parentesco gigantesco com programadores de sistema, principalmente os que trabalham com temas históricos, pois não dormem mais, só pensam nos seus projetos e a cada novo material que consegue juntar entra em paranoia até conseguir encaixar de forma perfeita. E é inegável o tanto de palmas que o diretor Johan Grimonprez merece pelo tanto de material que conseguiu para construir seu longa, sendo daqueles que em momento algum ele precisou de uma narração extra, de fabricar algum video ou então desenvolver algo para que seu filme ficasse preciso de ideias, fosse completamente amarrado pelos shows das bandas, e que sem firulas contou exatamente como usaram Louis Armstrong e o jazz para ir modelando um golpe na República Democrática do Congo logo após sua independência da Bélgica. Ou seja, é daqueles filmes que você se assusta ao ver a duração, principalmente para um documentário, mas que não consegui enxergar pontos que o diretor poderia ter eliminado, afinal a história inteira foi muito bem usada com todo o material, e assim sendo o filme evolui fácil, mas tem de gostar do estilo musical e de História, senão a chance de dormir também é bem alta.

O longa reconstitui os últimos meses antes de Patrice Lumumba, primeiro presidente eleito democraticamente do Congo, ser assassinado em 1961. Em protesto, os músicos Abbey Lincoln e Max Roach invadem o Conselho de Segurança da ONU. Ao mesmo tempo, Louis Armstrong é enviado para o país como uma cortina de fumaça dos planos norte-americanos de depor Patrice. É a partir desse episódio, um bom representante das conexões entre imperialismo, capitalismo e jazz, que o diretor Johan Grimonprez traz o panorama das artimanhas políticas que incendiaram o contexto internacional da época. Marcado pela Guerra Fria, pelo movimento de independência pan-africanista, pelas mudanças no quadro de poder das Nações Unidas e pelas lutas por direitos civis nos EUA, o século XX e suas revoluções são o mote para um documentário ávido em entender os dilemas de uma história em disputa.

Diria que o trabalho do diretor, roteirista e editor Johan Grimonprez foi impecável, tanto que não bastando a indicação de seu trabalho ao Oscar, tem ganhado e sido indicado à várias outras premiações, inclusive no Critics voltado para documentários estará presente em 4 categorias, e se com 150 minutos ele conseguiu compor algo tão imponente, fiquei imaginando a quantidade de material que ele tinha em suas mãos, aonde foi buscar tudo e como isso veio em sua mente, pois não é um tema muito falado, e num momento tão bagunçado no mundo atual vir falar de golpe de estado, lembrar de uma época caótica no Congo, e ainda usando o jazz como pano de fundo, foi sem dúvida algo brilhante de se fazer. Claro o trabalho dele é notável demais na tela, porém friso que não é algo fácil de digerir, afinal ele nos entrega nessa duração muita informação, sendo daqueles filmes que você chega até se perder em detalhes, e o ritmo não é daqueles que te prendem, mas sim daqueles que faz viajar nas canções, e assim o resultado funciona, mas se a pessoa realmente se interessar pelo tema, senão a chance de sair de órbita com o jazz gostoso de fundo é bem alta.

Como é um documentário usando materiais de arquivos nem tenho como falar de atuações, entonações e do ambiente em si, mas sim apenas pontuar mesmo o quanto ele conseguiu criar uma narrativa precisa com momentos de shows, gravações das revoltas no país, da invasão e das reuniões da ONU e muitos depoimentos que cada um foi dando de acordo com a intensidade nos diversos momentos que foram ocorrendo, tudo isso claro com canções icônicas da época do jazz, e muitas que foram feitas em cima de tudo que rolou, num trabalho de encontros certeiros e bem colocados dentro da edição precisa e direta.

Enfim, ainda preciso ver os outros candidatos ao Oscar de Melhor Documentário, mas certamente no atual momento, esse é um grande candidato não só pelo trabalho de montagem, mas por tudo que vem ocorrendo mundo afora, então acredito que os votantes vão levar muito isso em consideração. Então fica a dica para conferir ele nos cinemas do país a partir do dia 30/01, e eu fico por aqui hoje agradecendo os amigos da Sinny Assessoria e da Pandora Filmes pela cabine de imprensa, então abraços e até amanhã com mais textos.


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